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HitdaBreakz

8/31/2004

DIGGIN'.PT: MIGUEL GRAÇA MOURA



Pois é, esta é a resposta ao Challenge # 2 - Miguel Graça Moura - Pianorama Vol. 3. A faixa em questão tem o título "Europe (Earth Cry Heaven's Smile)". Infelizmente, estes discos não trazem praticamente informação nenhuma, não incluem ficha técnica e por isso nem sequer podemos imaginar quem se encontrava por trás de cada instrumento. Sabe-se, isso sim, que este senhor, ex-Pop Five Music Incorporated (o single Orange, deste grupo, é uma preciosidade, com uma versão muito interessante de Mission Impossible) tomava conta de tudo o que eram teclados. Hoje em dia, Graça Moura dedica-se a outras músicas e é com a batuta e não com os teclados que tenta capturar a nossa atenção. Resta dizer que a faixa "Europe..." é mesmo a única coisa de jeito neste disco. Um dia destes colocaremos por aqui os dois breaks de bateria do Pianorama Vol. 2.


HIT DA BREAKZ CHALLENGE # 2


Fica aqui outro momento da memória musical portuguesa impressa em vinil. Trata-se de um muito interessante exercício jazz funk que, não por acaso, faz parte do único tema que vale a pena no LP em questão. Uma vez mais pedimos que identifiquem a origem, mas desta vez levantamos a fasquia e prometemos um prémio a ser entregue via www.yousendit.com. Baixámos um pouco a qualidade do som para que se possa dilatar a duração do excerto em causa.

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8/30/2004

DIGGIN.PT: PAULO DE CARVALHO



O 1º Challenge Hit da Breakz já está resolvido, como podem ver nos Comments do Post anterior. Os samples são mesmo de dois álbuns de Paulo de Carvalho de 74 e 77, respectivamente. Fica aí a prova de que há grooves para desenterrar na produção nacional dos anos 70. Boa caça! E parabéns a quem descobriu: o nosso apaluso! O 2º Challenge Hit da Breakz aparecerá por aqui em breve.



HIT DA BREAKZ CHALLENGE # 1




Muito bem, fica aqui um pequeno desafio: por vezes, na ânsia de descobrirmos na Feira da Ladra os discos de funk produzidos nos Estados Unidos ou os Libraries franceses mais obscuros descuramos o óbvio e o mais vulgar. E às vezes, mesmo por debaixo do nosso nariz, escondendo-se na familiaridade de nomes que todos conhecemos, há pequenas pérolas que nos podem encher de orgulho.
Vou deixar aqui seis excertos de dois discos portugueses que têm em comum o nome que domina a capa. Num dos excertos há uma pista muito clara. Serão endereçados aplausos ao/à primeiro(a) digger que adivinhar a identidade artística por trás destes samples.

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8/29/2004

SOUL, PRAIA E NOTAS SOLTAS



Os últimos cartuchos do Verão queimam-se sempre com um pouco de praia e outro tanto de reflexão. E é assim que os últimos capítulos de Sweet Soul Music crescem de intensidade, como se Peter Guralnick tivesse conscientemente estruturado o seu livro como uma boa canção soul, com um arranque doce e temperado e um crescendo imparável depois do primeiro refrão (e agora que penso nisso, se calhar foi mesmo o que ele fez…). Perceber como é que Memphis serviu de laboratório de ensaio para a construção da grande canção negra norte-americana, sabendo-se como Memphis era um enclave tradicional do Sul que deu ao mundo Elvis, por exemplo, tem sido muito revelador para mim. Mais ainda quando, nas entrelinhas ou de forma mais declarada, Guralnick vai deixando formar-se a ideia de que as ligações entre campos tão aparentemente opostos como o country e a soul existiam e eram fortes. Solomon Burke, por exemplo, gravou clássicos da country transformando-os em sucessos impressionantes o suficiente para ser convidado para celebrações de um Ku Klux Klan interessado nos êxitos que se ouviam na rádio (numa época em que a imagem de um cantor ainda não andava agarrada irremediavelmente à sua voz)… As ligações iam, no entanto, para lá de um cancioneiro partilhado e traduziam-se em músicos comuns, compositores do country que escreviam para estrelas soul, editoras como a Hi que começaram por lançar rockabilly antes de descobrirem o R&B. Enfim, Sweet Soul Music é um mundo imenso, maior do que as suas 400 páginas deixavam entender!

Chegado a casa, a sede de soul/R&B era muita. Por isso mesmo peguei num disco que trouxe para casa naquela expedição que me rendeu igualmente o já por aqui referido maxi de Funky Drummer de James Brown. Trata-se de uma compilação da Bell (grande concorrente da Atlantic, no período formativo da Soul nos anos 60) de título Rhythm and Blues Vol. 4.
O disco está um pouco em mau estado, com a lombada rebentada e muitas notas escritas na contracapa, certamente para guiar os DJ’s que utilizavam este disco. O vinil, no entanto, revelou estar em forma depois de uma lavagem. Curiosamente (ou talvez não, para os que acreditam que não existem coincidências) o álbum abre com um espantoso momento de James CarrTo Love Somebody! [audio]– o torturado cantor que serve de “leit motiv” ao capítulo de Sweet Soul Music que hoje li na praia. Este volume 4 de Rhythm and Blues está dividido em duas partes: um Bluesy Side no lado A e um Rhythm Side no lado B. Carr abre o primeiro lado expondo a sua alma em To Love Somebody, uma canção dos irmãos Gibb. A história de James Carr é profundamente trágica: aparentemente, este homem que não sabia ler nem escrever, perdeu-se no seio do seu próprio sucesso, mostrando claramente não estar preparado para um mundo de contratos e negócios. Mas quando a sua voz se se entregava a uma canção conseguia produzir magia. E Guralnick transmite-nos todas essas impressões de forma apaixonante e cativante.

James Carr

Este volume quatro da colecção de R&B da Bell (não há data nesta edição francesa, mas estimo algures entre 66 e 68 como data provável para a sua edição) é bem exemplificativo do estado da soul nesta época. Canções maiores do que a vida com preocupações espirituais no lado Bluesy, temas mexidos e com inclinações mais terrenas no lado Rhythm. E logo aqui se percebe de que ramos saíram a soul e o funk…
No lado Bluesy podem destacar-se a algo psicadélica versão de Reach Out [audio] de Merrilee Rush e o bom reverendo Solomon Burke a entregar-nos a Palavra em Up Tight Good Woman.
Mas é no Rhythm Side que as coisas aquecem: uma investida pelos lados do frenético boogaloo com os The Emperors em My Baby Likes To Boogaloo [audio](floor shaker de primeira dimensão); um rapidíssimo Soul Affection [audio]dos The Interpretations (e se a bateria deste tema aparecesse limpa talvez o drum n’ bass pudesse ter contado com um concorrente à altura do grande Amen Break); e, para mim pelo menos, uma enorme revelação na voz de Sam Hutchins no intenso Dang Me, um tema que ilustra bem a dicotomia entre o lado mais espiritual herdado do gospel [audio] e o lado mais terreno legado pelos blues [audio]. Juntas, essas duas vertentes deram ao mundo a Soul e o Funk. Proveitosa, sem dúvida, a ligação.
Este álbum da Bell levanta uma outra questão intimamente ligada ao diggin’, pelo menos para mim. Um digger, muito mais do que um viciado em discos é um viciado no inesperado, na descoberta. E muitas vezes compram-se discos apenas pela remota possibilidade de acontecer aquele momento mágico em que a agulha toca no vinil e inaugura um mundo novo para os nossos ouvidos. Não acontece sempre e, por vezes, quando acontece não é o mundo de que estamos à espera. Mas de vez em quando acende-se uma luz com uma nova voz, um novo músico ou até um imenso território que não esperávamos vir algum dia a abordar. Como o dia em que uma cópia imaculada de Profondo Rosso dos Goblin apanhada na Feira da Ladra me sintonizou, finalmente, com o rock progressivo. Mas essa é outra história e ficará para outro domingo de praia!


8/27/2004

BREAK DA SEMANA TM : TOWER OF POWER - MAHDI, THE EXPECTED ONE




Um disco numa editora como a Blue Thumb é sempre uma surpresa, tal era a diversidade de gente que gravava para a Blue Thumb (desde o Captain Beefheart ao Phil Upchurch, desde o Gabor Szabo à dupla Ike and Tina Turner, passando até pelos Doors após a morte de Jim Morrison, banda a que os membros sobreviventes chamaram Butt Band).

E este mantém a tradição. Na capa, que podem ver em cima, encontramos um senhor de barba e cabelo comprido e com aspecto marreca à frente de uma mesa de mistura de uma rádio. Atrás dele, Júpiter e Saturno e uma linha de horizonte que se supõe ser São Francisco à noite, já que o título do álbum é "Lights Out: San Francisco". Por baixo, descobrimos o nome do senhor, chama-se Voco e é seu propósito apresentar a "soul of the Bay Area". Não tenho aqui a minha câmara digital mas gostava que vissem o interior do disco (é um gatefold - uma capa de LP que abre como se fosse um livro e que, neste caso, contém um texto no interior) - lá dentro temos Voco e a sua namorada, que, como Voco, é radialista para uma rádio de divulgação de música não-comercial muito importante desta altura (estamos a falar do início dos anos 70) , a KSAN. Ela chama-se Dusty Street e tem aquele aspecto angélicohippie como só as meninas dos anos 70 de São Francisco têm.

Mas o que é que um programa de rádio tem a ver com um disco duplo na Blue Thumb? A resposta tem de ser encontrada no passado de Abe "Voco" Keshishian (já verifiquei no disco e nem assim acho que acertei a escrever o apelido). É que Voco, para além de ser o importante divulgador musical que foi (principalmente na área dos blues), sempre teve o bichinho do estúdio, produzindo uma série de álbuns, como staff producer ou como produtor independente. Foi ele, por exemplo, que "apadrinhou" a entrada dos Blue Cheer na música a sério. E é com este bichinho que aparece este álbum. Diz Voco : "Durante anos andei atrás das editoras para gravar um álbum conceptual intitulado Lights Out mas a resposta era sempre a mesma - os álbuns conceptuais não vendem nada porque não os podemos tocar ao vivo - o que traduzido para linguagem não-capitalista significa 'não somos donos de quem toca no álbum'. Mas, graças à Blue Thumb e a Tommy LiPuma e Bob Krasnow [os donos da editora], vou poder fazê-lo".

O álbum é duplo e é indicativo do que era o programa de rádio de Voco. Se quiserem, podemos dizer que Voco era um Gilles Peterson dos anos 70 - passava desde música clássica a música electrónica, jazz ocidental e oriental, pop e muitos blues ("from B.B. King's Hold that train, conductor into Richard Strauss' Also Sprach Zarathustra into Bufallo Springfield's Broken Arrow"). Nele, encontramos faixas incríveis de gente tão diversa como os Tower of Power (que em quatro temas fazem de Lights Out um seu mini-álbum apenas disponível aqui, já que nunca nenhum destes temas foi tocado num álbum deles ou sequer passível de ser encontrado numa sua colectânea, em vinil ou em CD), Fadil Shahin, as Pointer Sisters, Linda Tillery, Lydia Pense, Clifford Coulter ou John Lee Hooker (assessoriado por Neal Schon).

Deixo-vos aqui alguns excerptos de temas do álbum para que o possam apreciar o suficiente para tentarem procurar um exemplar. Os comentários aos temas são feitos pelo próprio Voco.

John Lee Hooker - Lights Out [audio]

"O tema que abre o álbum, Lights Out, é o tema título e a minha primeira tentativa para escrever uma letra. O que Lee Hooker canta é o que eu digo quando entro no ar todos os sábados à meia noite na KSAN... É meia noite, luzes desligadas, roupa despida, velas acesas, incenso a dispersar-se, não precisamos de electricidade, eu vou ser o amplificador porque nós conseguimos dançar no escuro". A secção rítmica é funk puro, com o sincopar certo e calmo de Geno Skaggs [baixista]. Neal Schon (com 18 anos) já é um dos mais importantes novos guitarristas que apareceu nestes anos. A sua maneira de tocar é uma experiência linda. Alguns de vocês, melómanos mais dedicados, devem-se lembrar dele enquanto Bo Duddley. Ele toca actualmente na banda Loading Zone [a banda também da Linda Tillery]. O tema foi gravado num take com John Lee Hooker conduzindo, cantando, tocando e compondo."

Sylvester and his Hot band - Hey that's no way to say goodbye [audio]

"Hey that's no way to say goodbye [do Leonard Cohen] e o tema seguinte, Why was I born? [que conta com a participação das Pointer Sisters], marca a estreia discográfica de Sylvester and His Hot Band. As suas actuações ao vivo são lendárias para quem teve a sorte de o ter visto na Bay Area e, também, em Nova Iorque. Foi a Dusty Street que nos apresentou. Tendo ouvido a sua voz num spot de 30 segundos na KSAN e depois poder ver como ele é gracioso e belo enquanto artista, não me contive e convidei-o para fazer alguns temas para o meu álbum. Ter aceite o meu convite foi um momento muito feliz para mim. (...) Enquanto escrevo isto, Sylvester está a juntar material para o seu primeiro álbum, que eu vou ter a sorte de produzir, para a Blue Thumb. Neste tema, podemos ouvir novamente o brilhante jovem guitarrista Neal Schon."

Tenho de fazer um comentário aqui. Este Sylvester é o Sylvester, o grande artista que explodiu na cena disco com hits como You make me feel (mighty real), que conta com a participação do enorme Patrick Cowley e que é um dos singles crossovers entre o italo e o disco. É igualmente vocalista de um tema, muito conhecido na cena disco, do Herbie Hancock (o "Magic Number").

BREAK DA SEMANA TM : TOWER OF POWER - MAHDI, THE EXPECTED ONE [audio]

E agora o break. O break é fabuloso, está no início do tema "Mahdi, the expected one", que era outro nome pelo qual Voco era conhecido, este mais a condizer com o aspecto místico que Voco apresenta nas fotos que estão no álbum. O tema foi composto na noite anterior à gravação pelos Tower of Power. Quem toca o break é um dos bateristas mais negligenciados de toda a cena funk, o Dave Garibaldi. O homem é um colosso e basta ouvir os álbuns dos Tower of Power para perceber a intensidade com que ele encara os pedaços de pele que tem à frente. E para quem, mesmo assim, tem dúvidas, é favor clickar no link em cima e presenciar um dos melhores breaks que tenho na minha colecção.

Por curiosidade apenas, quando arranjarem o disco, irão notar que, na parte de trás da capa, o nome Tower of Power está tapado por um autocolante. Isto aconteceu porque quando o disco ia sair, os Tower of Power tinham acabado de assinar um contrato discográfico com a Warner e esta foi a maneira encontrada para resolver o imbróglio jurídico em que as lutas de editoras são férteis.

nota : todos os links com a palavra [audio] à frente contêm um pequeno sample em mp3 da
música de que se está a falar nesse link




A FONTE IR ATÉ VOCÊS


Num post mais abaixo, o digga diz uma grande verdade: "não se esqueçam de onde vivem" - Portugal. E é uma grande verdade quando a aplicamos ao diggin'. É que o facto de termos vivido fechados sobre nós próprios durante tanto tempo em anos em que a música deu o grande salto noutros países, fez com que muitos dos discos lá de fora não chegassem a nós. E isto ainda é mais verdade quando olhamos para a soul, para o funk, para o hiphop e para tantos outros estilos que foram e ainda hoje são ignorados (mas cada vez menos, à medida que vamos reorientando as nossas balizas auditivas para estes estilos e, também, à medida que temos acesso cada vez maior a estes tipos de sons, seja nos jornais, revistas, seja nas rádios, nas televisões como a MTV, na publicidade - quem não se lembra do Express Yourself da Watts 103rd Band, grande banda de funk, num anúncio de gelados - e, principalmente, nas editoras, no caso do hiphop, em Portugal, como a Loop ou a Matarroa).

E em que é que este antigo desinteresse nestes estilos tão caros ao diggin' afectam esta nossa busca musical? Em vários campos e vão ver como são tão importantes.

Primeiro, o desinteresse manifesta-se na falta de discos de funk e de soul ou mesmo de jazz em lojas de segunda mão. É natural que muita gente, no início dos anos 80 e com o advento do maravilhoso compact disc, se desfizesse dos vinis, acreditando num "admirável mundo novo", e isso teria reflexos nas lojas de discos em 2a mão. Ou nem precisamos de ir tão longe, basta que haja necessidade de fazer espaço para um novo bebé, para arranjar espaço, sei lá, para limpar a casa e lá vão os vinis para o lixo. É comum isto acontecer e é este o ciclo normal do vinil que encontramos nas lojas em 2a mão. Mas o vinil que encontramos raramente é funk ou soul ou hiphop ou outra coisa qualquer que não seja Top 10, Tops of the pops e discos da Eurovisão (que até valem dinheiro mas que raramente valem musicalmente).

Em segundo lugar, o desinteresse manifesta-se na quase completa ausência de bandas de funk ou de soul portuguesas. Era normal, como aconteceu no rock, que, ao ouvirmos discos de que gostamos e tivéssemos o bichinho da música, houvesse vontade de fazer algo parecido. Assim, se houvesse grande interesse pelo funk ou pela soul, teriam havido, em Portugal, algumas bandas de funk ou de soul. Atenção, isto não pretende ser a "última palavra" na questão - há muito na discografia portuguesa da altura para ser (re)descoberto e há muito trabalho a fazer para desenterrar todas as pérolas portuguesas ainda escondidas e é este o trabalho que os diggers portugueses têm que ajudar a fazer.

Mas enquanto não descobrimos os tais discos portugueses de funk ou de soul perdidos nos anos 60 e 70 (somos tão optimistas aqui nós, não somos?), para saciar esta sede, temos que os ir buscar a outro lado. Como sabemos, há duas maneiras de ir buscar estes discos: indo à fonte ou a fonte ir até vocês. Ir à fonte é o sonho de qualquer digger mas nem sempre é possível. Por isso, e como estão a ler este blog, têm acesso imediato à segunda resposta: a internet. E é disso que este post trata: dos sítios aonde ir buscar esses tais discos online.

Há uma grande divisão entre os diggers sobre comprar discos online ou, como lhe chamam, fazer e-digging. Dizem os fundamentalistas que "fazer digging é ficares com as mãos sujas, é tocares nos discos, não é usares paypal para pagares por algo que só recebes dentro de uma semana". Mas os fundamentalistas costumam ser tipos que têm acesso (fácil ou difícil) a discos de soul ou de funk, por exemplo. Nós, aqui em Portugal, não temos grande acesso a discos destas áreas editados por majors e o acesso a discos de edição local, como é comum existir nos EUA, é quase igual a zero. Por isso, a minha posição relativamente ao e-digging é favorável.

Vou meter aqui alguns sites que vos dão dar algum trabalho dado o extenso conteúdo musical que cada um deles tem.



ebay.com

É a fonte das fontes : aqui, encontramos todos os discos que alguma vez desejámos. A ebay é um site de leilões online onde os discos são postos à venda até uma hora e data específica e qualquer pessoa registada na ebay pode licitar o disco até um determinado valor. No fim do leilão, quem der mais pelo disco, fica com ele. Neste preciso momento, existem 150283 discos de vinil na ebay à venda - um número estupendo. A maioria das boas lojas de discos tem, agora, o hábito de guardar para a ebay os seus melhores discos em vez de os meter à venda nas suas lojas físicas, na expectativa de que o preço suba com o maior número de compradores que a internet proporciona. Mas o que para eles é vantagem, para nós, compradores, nem por isso. Assim, a ebay e o próprio sistema de leilões, aliado à ausência de um preço fixo para os discos em 2a mão, faz com que, muitas das vezes, os discos incríveis que queremos desde sempre ter atinjam preços impraticáveis para as nossas bolsas. Por isso, tenham atenção aos preços e tenham uma certeza: são raros os discos que não aparecem outra vez num futuro muito próximo. E outra regra de ouro, se o outro licitador com quem vocês estão a competir para comprar o disco em leilão tiver um nome parecido com Shinjiro, Kazumi ou Onaguchi, quer dizer que é japonês e isso geralmente quer dizer "fundos ilimitados", por isso, deixem o disco ir para o Japão e tentem apanhar o próximo.



GEMM

A GEMM é um site que, como a ebay, agrupa imensos vendedores diferentes e os põe em contacto com compradores de todo o mundo. No entanto, a grande diferença entre a GEMM e a ebay está na maneira como o preço do disco é determinado. Enquanto que, na ebay, o preço a pagar é determinado pelo leilão do disco, onde o comprador que der mais pelo disco, fica com ele; na GEMM, o disco é vendido pelo preço que está pré-determinado. Tenham é cuidado, a GEMM é daqueles sítios onde alguns vendedores, sabendo do exorbitante preço atingido por alguns discos na ebay, tentam meter o preço pré-determinado a um valor muito acima do justo, à espera que alguém o compre, tipo isca. Mas há mais! A GEMM deve ser dos sítios onde há maior disparidade de preços em relação a um mesmo disco. É que, sendo o disco a maior parte das vezes um disco em 2a mão, o preço é difícil de ser determinado. Por isso, há discos que são lixo para uns e obrasprimas para outros, e isso reflecte-se no preço. E é isso que me chateia um bocado na GEMM, esta enorme disparidade de preços que nos obriga a andar com constante atenção em relação ao que vamos pagar. Aproveitem a GEMM e transformem este inconveniente numa vantagem, como eu tenho tentado fazer: o dobro da atenção necessário para comprar na GEMM faz com que encontre por lá coisas incríveis, que de outra forma me teriam passado ao lado, a preços estupidamente baratos.



Dustygroove

Uma excelente loja de discos e CDs. Especializou-se em soul, funk e jazz nos discos em 2a mão mas não descura outros estilos - a sua colecção de discos brazileiros nem é má. Tem uma excelente selecção e costuma ter todos os clássicos do estilo, seja em vinil seja em CD. O grande inconveninente desta loja é o facto de ter discos em 2a mão e discos novos (reedições) todos misturados. Por isso, tenham cuidado a comprar e vejam se estão a comprar um disco reeditado ou um original em vinil. Tem outro inconveniente para quem vive em Portugal: usam sempre a UPS e isto, como sabem, implica que os custos para o envio dos discos é superior ao que seria se fosse usado os correios normais (US Postal lá, CTT cá). Desta forma, se encomendarem algo de lá, peçam um número decente de discos para que façam os custos de envio render. Ah, já me esquecia. A grande grande vantagem da Dustygroove é o facto de ter relações privilegiadas com um determinado senhor cujo último nome é escocês e tem uma editora chamada Kilmarnock (trabalhem!). De vez em quando, aparecem discos originais de 1970 e tal em estado NOVO/FECHADO a preços incríveis (1/5 do que pagariam na ebay por eles, por exemplo) porque o Mac encontra caixas fechadas de discos dele na cave da sua casa e é à Dustygroove que saiu o brinde de ter de os vender. Mas estejam muito muito atentos! É que os stocks desses novos-velhos discos não duram mais do que 1-2 dias. Eu e o digga comprámos um dos nossos holy grails do Mac aqui e nestas condições que vos expliquei.



Turntablelab

O laboratório do prato (turntable) é exactamente isso, o sítio onde se arranja comida para a agulha, discos em vinil. Está mais orientada para o hiphop mas não descura outros estilos (como o house ou o reggae) e não foge à habitual secção de discos de funk e de soul (a maioria são reedições). Tem outra coisa óptima, que a Dustygroove, por exemplo, não tem, que é a capacidade para ouvirmos excerptos dos discos. Ou seja, temos o nosso ponto de escuta sempre em acção, o que ajuda quando temos discos em dúvida, principalmente discos de que nunca ouvimos falar. Outra coisa boa é o facto de as descrições serem divertidas e fáceis de compreender. No entanto, pecam pela pouca informação que dão a quem procura outro tipo de referências para além do básico "nome da faixa", "editora e ano de edição".


8/25/2004

5 BREAKS 5



TOM JONES - Looking Out My Window [audio]

A primeira vez que ouvi este break foi na compilação The Document, do DJ dos Portishead Andy Smith. É um bom exemplo em defesa do Post das compilações porque até ter ouvido o Looking Out My Window nunca me tinha passado pela cabeça procurar discos de Tom Jones. E afinal... até valia a pena. O Mr Sex Bomb tinha alguns moves e sabia-se rodear das pessoas certas. Só para terem uma ideia, este tema tem arranjos de Keith Mansfield, apenas um dos maiores nomes do mundo da Library Music e muito especialmente da label KPM! É bastante fácil arranjar este single. Eu já o vi algumas vezes, mas, curiosamente, sempre em mau estado.


OCEAN - Put Your Hand in the Hand [audio]

Conhecem a canção do padre Borga que fala de pôr a mão na mão do Senhor da Galileia? Pois é... trata-se de uma versão deste tema que aliás já teve dezenas de versões. E todas as que conheço têm um break (exceptuando a do sr padre...). Este single tem a particularidade de ter uma etiqueta bem bonita da Kama Sutra, uma pequena label que era distribuída pela Buddah. Mas mesmo que a etiqueta fosse feia isso nunca afectaria o facto deste break ser excelente. Encontrei este single na Feira da Ladra há uns dois anos, antes dos discos por ali terem "secado".


APHRODITE'S CHILD - Air [audio]

Continuando numa onda de breaks fáceis de arranjar e com o seu quê de estranheza, temos este pedaço de groove passado através do phaser da responsabilidade dos Aphrodite's Child, a banda de Vangelis e Demis Roussos! O efeito colocado nos Hi Hats torna este break um pouco estranho, mas, ainda assim, passível de ser usado no contexto certo. Existe muito coleccionismo à volta dos nomes de Vangelis e Roussos e isso, claro, afecta os Aphrodite's Child. Mas este single é de edição nacional e já o vi algumas vezes. Tem o senão de sofrer do mesmo problema do single do Tom Jones: quando aparece tem sempre o aspecto de um artefacto arqueológico com alguns milhares de anos!



KING CURTIS - Memphis Soul Stew [audio]

Em 1968 o velho R&B de que King Curtis era um devoto fervoroso começava a mudar e gente como Jerry Wexler e Tom Dowd estava bem no centro do turbilhão ajudando a Atlantic a acompanhar os tempos. Este tema é um clássico e também tem várias versões (sempre com o break!), mas neste disco (um EP de quatro temas, edição nacional) a bateria surge com aquele punch característico da época, retendo a identidade do grande Sul americano, onde o funk começava a espalhar-se com a força de uma tempestade. Este single foi comprado na Discolecção!


STAPLE SINGERS - Stay With Us [audio]

Finalmente, The Staple Singers com Mavis Staple. Esta família musical exemplificava na perfeição o espírito do Sul e como a música podia ser bem transportada deste a igreja até aos bares, mantendo sempre uma indiscritível identidade profunda. Acho que foi a isso que chamaram soul... Enfim, este tema não tem propriamente um break, mas a bateria que dá o arranque à canção tem um som fabuloso ou não tivesse sido gravada por Steve Cropper dos Booker T & The MG's nos grandes estúdios da Stax. Material clássico que eu descobri, sem capa, na Feira de Paço de Arcos. 50 cêntimos excelentemente gastos!


8/24/2004

DIGGIN' DA COMPS


Os diggers mais fundamentalistas fogem de compilações como o diabo da cruz, ainda mais se essas compilações estiverem impressas em CD. Mas, seja na religião, no desporto ou no diggin', o fundamentalismo nunca conduziu ninguém à iluminação. Por isso mesmo, há vários argumentos a favor destas compilações.

Nunca se esqueçam de onde se encontram. A menos que um vosso tio tenha trabalhado numa exploração petrolífera do Texas nos anos 70 e tenha aí alimentado uma paixão por funk com a compra compulsiva de 45s é muito difícil que venham algum dia a encontrar algures em Portugal algum dos raros Texas 45s que fazem as delícias dos mais experimentados diggers. Por isso, se querem ouvir a música não se desviem das oportunidades, mesmo que elas se apresentem sob a forma de uma compilação em CD!...

Seguindo o exemplo apresentado no parágrafo anterior: a menos que um vosso tio tenha descoberto o seu próprio poço de petróleo (depois de aprender os truques do ofício numa exploração do Texas...), construído uma enorme fortuna e contemplado o vosso nome no testamento, não me parece que seja saudável pagar o preço que certos discos adquirem pela sua raridade. Por isso, a última frase do parágrafo anterior aplica-se igualmente aqui.

Mesmo com a conta bancária bem recheada e um orçamento mensal generoso para a compra de discos, nada garante que se encontrem os discos que se desejam só porque os procuram. É frequente nas entrevistas a alguns diggers estes falarem de discos que demoraram anos a encontrar. Veja-se, por exemplo, o caso de Kon (da dupla Kon & Amir), que demorou 10 anos a encontrar uma cópia do Stark Reality. Por isso, possuir algumas coisas em CD pode ser apenas um jogo de antecipação.

Toda a gente precisa de pointers, dicas, direcções. Ler entrevistas com diggers como Soulman, recolher informação em revistas como a Waxpoetics, passar os olhos por fóruns onde o diggin' é o assunto central, como acontece no site da Soul Strut, por exemplo, dará muita informação a quem dela precisa. Mas as compilações são igualmente importantes: por vezes revelam-nos todo um mundo novo (um género, um país, uma época, uma editora) ou então dão-nos pistas que serão uteis no terreno.

Finalmente: não esquecer o carácter prático das compilações. São óptimas para nos acompanharem em viagem e poupam-nos imenso trabalho (recolher 20 vinis diferentes, gravá-los para o computador, fazer edits dos arranques e paragens do vinil, etc... não é trabalho fácil!).

Por isso tudo, apresentamos agora 9 compilações mais ou menos recentes que são igualmente óptimas ferramentas de trabalho, excelentes fontes de prazer e profundíssimos poços de informação.



BAY AREA FUNK (Luv n' Haight)
Mais uma numa série de compilações organizadas segundo princípios geográficos (a mais famosa será, provavelmente, a "Texas Funk"). Esta, como indica o subtítulo, apresenta-nos "funk & soul essentials from San Francisco, Oakland and the Bay Area, 1967-1976." São 16 faixas de outros tantos gloriosos desconhecidos com fabulosos momentos de funk e soul com o sabor distinto da Bay Area (grooves acentuados, mas com arranjos algo sofisticados e carregados de classe).

BRAINFREEZE BREAKS/BRAINFREEZE
A inclusão destes dois discos é propositada: em Brainfreeze poderão perceber qual o resultado final de uma séria e intensa actividade de diggin' quando levada a cabo por nomes como DJ Shadow ou Cut Chemist. Brainfreeze Breaks, por outro lado, é a matéria prima e uma compilação que representa o esforço de uma comunidade de diggers em recolher o espólio principal usado pela dupla Shadow/Chemist. Há quem questione o interesse de uma compilação assim, mas de que outra forma se poderão ouvir as absolutas raridades usadas por Shadow e Cut em Brainfreeze? (Já existe igualmente disponível a compilação Product Placement Breaks...).

NEVA STOP DIGGIN'
Disponível aqui, esta compilação de Soulman (um dos maiores diggers de sempre e um pioneiro na partilha de informação sobre diggin' nas colunas que assinou na imprensa americana) mostra-nos discos samplados por gente como Mos Def, DJ Premier, Beatnuts e Jay-Z além de uma série de outros loops ainda não utilizados. De certa forma, compilações como esta servem apenas para nos educar os ouvidos (e para nos espicaçar o instinto), pois não há informação disponível das faixas usadas.

THE WONDER OF STEVIE (Harmless)
Esta compilação organizada por DJ Spinna e Bobbito Garcia vai agora no segundo volume. Com nomes como Spinners, Minnie Ripperton ou Charles Earland e Gene Harris a aparecerem nestes dois volumes, estas compilações revelam-se impressionantes depósitos de pistas para qualquer digger, partindo do universo de Stevie Wonder. Mais jazzy a primeira, mais soul a segunda, ambas são fabulosos exercícios de perspectivação da carreira de um artista através do legado do seu cancioneiro na música de uma época específica.

ROYALE WITH BEATS
A Royale With Beats é uma compilação criada com o propósito de angariar fundos para manter o site da Soul Strut a funcionar. Digged & Freaked por Raj Mahal, como se explica na única informação disponível, esta compilação serve igualmente para nos educar, sobretudo com algumas sonoridades mais europeias e algumas faixas de Library Records.

RARE EQUATIONS
Cut Chemist, companheiro de aventuras de DJ Shadow e homem dos Jurassic 5, é o nome por trás desta compilação, já editada há um par de anos. Originalmente este CD apareceu sem informação de conteúdo, mas hoje o alinhamento já se conhece muito bem. Trata-se de uma fabulosa viagem em dois CDs ao universo do jazz e do funk (e suas intersecções) que Chemist mais cultiva. Rare Equations é igualmente uma excelente preparação para o álbum novo de Cut Chemist que está prestes a chegar!

BECAUSE YOU'RE FUNKY
Esta compilação tem igualmente um par de anos e apresenta-nos mais uma perspectiva possível do grande território do funk, com a carecterística interessante de ser concebida no Reino Unido onde, curiosamente, se encontram alguns dos maiores coleccionadores de funk do mundo. Basta ver o site da Deep Funk para se perceber o fervor com que em terras de Sua Majestade se segue a grande invenção de James Brown. A foto que incluo desta compilação é do meu exemplar promocional. A compilação está disponível com um aspecto bem mais interessante!

Há, obviamente, muitas outras compilações úteis aos diggers, mas eu centrei esta selecção exclusivamente no formato CD, procurando apresentar uma selecção onde se incluissem exemplos mais caseiros (Soulman...) e mais profissionais (Wonder of Stevie), mais duvidosos (Brainfreeze Breaks) e mais interessantes (Rare Equations). Há um mundo lá fora carregado de compilações que poderão orientar muitas expedições de diggin'. Mãos ao trabalho e sujem esses dedos!



8/23/2004

BREAKS - O ANTES E O DEPOIS


Breaks. É, ao pé de diggin', a palavra mais falada neste blog, não? Já falámos na importância que os breaks têm - a teoria, o blá blá que nos ajuda a entender porque raio é que anda tudo louco à procura em discos antigos de pedaços de som de bateria sem nenhum outro instrumento por cima. Mas, como noutras tantas coisas, o mundo da teoria não serve para muito. Por isso, vamos à prática.

Um break num disco, muitas das vezes, é um momento rapidíssimo: o disco está a tocar, blam!, temos o break, blam!, acabou o break e a música volta ao normal. O que é importante nos breaks é ter, como os músicos que iremos ouvir a seguir tiveram, a capacidade para ver onde é que aquele break se encaixa na nossa música. Ter a capacidade para ouvir aqueles segundos e dizer "isto serve". É que parece mais fácil do que é. Não é - é das coisas mais difíceis do sampling.

Neste post, vamos poder ouvir um break original e as adaptações bem diferentes que muitos músicos fizeram dessa apropriação do break original. Não nos vamos cingir ao hiphop, vamos andar por muitos outros lados, desde a pop ao drum n' bass.

Vamos abordar quatro breaks que não foram escolhidos ao acaso. São quatro dos breaks mais importantes da história da música moderna : o Funky Drummer do James Brown; o Synthetic Substitution do Melvin Bliss; o Amen Brother dos Winstons; e o Ashley's Roachclip dos Soul Searchers. Muitos de vocês, provavelmente, depois de ouvirem os breaks, irão ser capazes de nomear mais umas quantas músicas actuais que usam os breaks em questão - é que estes quatro discos são, sem dúvida nenhuma, os breaks mais samplados de todos os tempos. Vamos a eles.

Vou meter aqui vários links e todos eles contêm audio. O primeiro link é o break original e os seguintes são músicas que usaram esse break. Algumas músicas são conhecidíssimas, outras mais obscuras. Nalguns casos, o break vai ser fácil de ser detectado, noutros, nem por isso. No entanto, ali estão eles, transformados, editados, cortados, apenas sujeitos à imaginação do músico que os distorce.



1. JAMES BROWN - FUNKY DRUMMER



Em primeiro lugar, temos o Funky Drummer do James Brown, que é, quase de certeza, O break mais samplado de todos. Gravado originalmente em 1969 para a editora King, divide-se na parte 1 e 2 para cada lado do 45 rotações. No entanto, é possível encontrar a faixa toda e completa no álbum da Polydor, In the jungle groove (1986), que compila os maiores sucessos do James Brown, anteriormente editados em singles, e que é um dos seus discos fundamentais. O baterista de serviço é Clyde Stubblefield e faz um boom boom bap... bap bap boom bap irrepetível e tão tão original.
Podemos ouvir este break nestes temas:

Public Enemy - Bring the noise [audio]
Do álbum "It takes a nation of millions to hold us back", de 1998.

Dr. Dre - Let me ride [audio]
Um dos discos clássicos do hiphop e a definição do que é o g-funk, o "The Chronic" (1992), usa, neste megasucesso de Dr. Dre, o break também. Estejam atentos às tarolas do break original a aparecerem, a pontuarem o break.

Kriss Kross - Jump [audio]
O break do Funky Drummer neste sucesso mundial dos putos com a roupa ao contrário está "simulado", cortado - só meteram a parte inicial do break mas é perfeitamente audível o seguimento do break, a tarola que vem a seguir está lá, quase que fantasmagóricamente.

Deep Forest - Deep Forest [audio]
Os reis da música pop ambiental usaram o Funky Drummer neste tema, resultando numa das mais improváveis misturas musicais de todos os tempos: James Brown e cânticos de pigmeus.



2. MELVIN BLISS - SYNTHETIC SUBSTITUTION



O lado B do single Reward , editado na Sunburst em 1977. Foi posteriormente reeditado para o mercado inglês na Contempo, por isso, será mais fácil encontrarem aqui na Europa o single da Contempo. Mesmo assim, não é um disco muito comum.

O Synthetic Substitution foi usado em:

Ultramagnetic MCs - Ego Trippin [audio]
Um dos grandes clássicos do hiphop vem do grupo do Kool Keith, os Ultramagnetic MCs. Acaba quase por ser só o break e os MCs - quase como o Raw do Big Daddy Kane.

Dr. Octagon - Wild and Crazy [audio]
Parece que o Kool Keith gosta imenso deste break porque o usou noutro álbum posterior: este Dr. Octagonecologyst. Este álbum de 1996 que contém este Wild and Crazy, é do Kool Keith enquanto Dr. Octagon e conta com o total apoio do grande DJ QBert, provavelmente o maior (a par de Mixmaster Mike, agora nos Beastie Boys) turntablista de todos os tempos, e do Dan The Automator, agora dos multiplatinamundial Gorillaz. Deste álbum, o meu tema preferido é o Blue Flowers, que usa um sample de, imaginem, Bela Bartok - grande Automator! O break, neste tema, é bastante fácil de ouvir, não foi muito modificado.



3. THE WINSTONS - AMEN, BROTHER



É, por muitos, considerado o break que define o som rítmico do drum n' bass. E até faz sentido: não há muitos breaks com esta velocidade e com esta pujança - ambos elementos importantes para os ritmos fortes do drum n' bass, suficientemente fortes para suportarem aquele baixo dub que é tão característico.

Qualquer pessoa que esteja mais a par da música de dança conhece este break, mesmo que não saiba que o está a ouvir. Foi usado pelo Squarepusher, pelo LTJ Bukem, pelo Luke Vibert, pelos 4 Hero, Dillinja, J Majik... enfim, acho que não há ninguém no drum n' bass que não tenha uma vez na vida usado este break. Mas não foi só o drum n' bass que teve o monopólio do uso do break. Por isso, vai ser engraçado podermos comparar como o mesmo break é capaz de ser usado de forma tão tão diferente por estilos aparentemente tão diferentes como o hiphop e o drum n' bass.

Assim, podemos ouvir o break em:

Eric B & Rakim - Casualties of war [audio]
Outro clássico do hiphop por um duo que tem no "Paid in full" (1986) um dos seus clássicos álbuns. Esta faixa pode ser encontrada no excelente-mas-não-tão-bom "Don't sweat the technique" de 1992.

LTJ Bukem - Music [audio]
Este é o tema que, em 1993, define o tipo de som que o LTJ Bukem passou a fazer - aquilo a que muitos passaram a chamar de intelligent drum n' bass, sons musicais e harmonias planantes, longe da velocidade, do crime sonoro e das vozes aceleradas que caracterizavam muitos dos discos de drum n' bass da altura.



4. THE SOUL SEARCHERS - ASHLEY'S ROACHCLIP



Proveniente da mesma editora - a Sussex - que editou o Dennis Coffey (antes de este ir para a Westbound), cuja história podem ler num post abaixo deste, o álbum que contém este Ashley's Roachclip chama-se "Salt of the Earth" (1974). É um disco cheio de funk, numa altura muito boa para o funk, já maduro mas ainda suficientemente longe das influências (nos dois sentidos) do emergente estilo discosound. O disco tem este break, que o singulariza, mas vale pelo seu todo e é mesmo mesmo essencial para qualquer interessado por funk.

O break, esse, é dos mais fáceis de reconhecer, graças ao som tsst...tsst que o hihat aberto faz no break. E depois de ouvirem o break na sua versão original, aposto que ficaram a pensar "ei, conheço isto tão tão bem!". Por isso, e por pura diversão, vou só meter músicas pop mais do que conhecidas que usaram o break. Por serem mesmo tão conhecidas, vou-me abster de comentários, acho que basta ouvir para perceberem tudo e para reconhecerem nelas o Ashley's Roachclip.

PM Dawn - Set adrift on memory bliss [audio]

EMF - Unbelievable [audio]

Beats International - Dub be good to me [audio]

Milli Vanilli - Girl, you know it's true [audio]



nota : todos os links com a palavra [audio] à frente contêm um pequeno sample em mp3 da música de que se está a falar nesse link


8/21/2004

DIGGIN' EM LISBOA





Estes são alguns dos discos que encontrei numa sessão de diggin' (como se isto fossem sessões, tipo psicanálise...) que fiz com o digga, recentemente em Lisboa. O resultado nem pode ser considerado muito mau mas eu digo isso sempre que venho para casa com um James Brown debaixo do braço, principalmente quando não tinha o disco ainda. E é o caso deste álbum do James Brown, o The Popcorn, um dos seus melhores trabalhos instrumentais, típico do som dele do final dos anos 60, com grande ênfase nos sopros, mas, ao ouvirmos o In the middle, encontramos todas as características que qualquer disco do James Brown preserva. Este disco originalmente data de 1969 e foi editado pela King mas a versão que tenho é a europeia, editada pela Polydor e não faço a menor ideia quando foi editado para a Europa. Mas pela label e pelo aspecto do disco, diria meio dos anos 70, como se fosse um reintroduzir todo o som do James Brown a uma Europa desejosa de funk. Todo instrumental, o disco contém bastantes clássicos desta era do James Brown - casos do tema título, The Popcorn [audio] (versão instrumental do Mother Popcorn) ou o Soul Pride, aqui completo mas divido na label à boa maneira dos funk 45s na parte 1 e 2 (a parte 1 era o lado A do 45 rotações e a parte 2 era o lado B). Outro que está completo é o excelente In the middle [audio]. Para um digger, um disco instumental do James Brown é sempre sempre um disco para ter, por isso estejam atentos a este disco, que contém breaks, mas falar em breaks e em James Brown é quase um pleonasmo. Eu e o digger encontrámos dois, foi um para minha casa e a outra cópia foi para casa dele, por isso, este disco anda por aí.

Os dois Barry White são velhos conhecidos e fundamentais em qualquer colecção. O primeiro, o Rhapsody in White (20th Century Records, 1974), que é o que se encontra no canto superior esquerdo, contém um dos seus maiores clássicos, o Love's Theme. Mas o que a mim me dá especial prazer ouvir é o Midnight and you [audio], um dos meus grandes grandes temas do Barry White (que nem é escrito pelo Barry White mas pelo Gene Page). O outro que está a seguir é o Cant' get enough (20th Century Records, 1974), onde moram outros tantos clássicos barrywhiteanos como o You're the first, the last, my everything ou o Can't get enough of your love, babe. Se não conseguirem trautear logo estes dois temas, pelo menos, marquem 10 pontos no vosso cartão de tenho-de-ouvir-isto.

Na fila de cima falta-nos o T-Connection. É um disco de 1978, editado pela Dash, uma subeditora da TK, mais conhecida pelos numerosos 12 polegadas de disco que editaram. Nem por acaso, este T Connection, o segundo álbum da banda (o primeiro é o Magic), é disco puro, numa altura em que o disco estava ainda pujante de ideias. Deste disco, dois enormes temas (que, por acaso, o foram também nas listas de vendas, num raro momento de sincronia entre boa música e sucesso comercial) : o Saturday Night [audio] e o At Midnight, que abrem o lado B do disco.

O primeiro disco do lado esquerdo, da fila do meio, é um disco curioso, principalmente para quem se interessa por sons tipo library music. É um disco editado pela Kodak para servir de som ambiente para as projecções do Sound 8, aquela máquina que está na capa do disco. E funciona assim: se filmarem uma cena de família, tipo piquenique, então, enquanto o disco é projectado, passam a Music for Family Fun; se filmar uma cena na praia, o disco tem uma conveniente Music for Water Activites; e por aí fora. No final, tem ainda uns quantos efeitos de som (trânsito, palmas, cão a ladrar... coisas normais). Mas pronto, é para nos levar a um passado que nem está muito distante mas que parece bem distante.

Esqueçam o disco dos Martin Circus - é disco de péssima qualidade, feito de pormenores mas sem grande chama, principalmente para uma banda que fez o excelente (mesmo!) Disco Circus. O Ella Fitzgerald's Christmas é exactamente isso, um disco de Natal onde a diva torna tão especiais os tradicionais temas. Podia lá deixar um disco da Ella no sítio onde estava? O Burt Bacharach é um dos maiores compositores de todos os tempos e o Hal David um dos maiores fazedores de letras e juntos fizeram clássicos que todos conhecemos, mesmo que não saibamos que foram eles que os fizeram. Exemplo maior é o I say a little prayer, principalmente na versão da Aretha Franklin [audio] (raro exemplo de uma versão ser melhor que o original). Este Portrait in Time é um instrumental, com instrumentos a substituírem-se às vozes e contém quase todos grandes sucessos de Bacharach e Davis (A house is not a home, Say a little prayer, Raindrops keep fallin' on my head, Alfie, Do you know the way to San Jose, Sundance Kid). Um som tão calmo mas tão poderoso que entra em nós sem darmos conta, e quando damos conta, já estamos a trautear ou a abanar o pé devagarinho, mas sempre com uma sensação de bem estar, como só a música boa nos dá.

O disco dos I Pyranas é um disco de covers, editado pela RCA sem data mas deve ser lá para final dos 60s pelas covers que são feitas (Beatles, Moody Blues). O interessante do disco é ser tão tão ecléctico: tanto fazem uma cover do Obladi Oblada dos Beatles como o fabuloso Mercy, Mercy, Mercy do Joe Zawinul, de que falámos mais abaixo a propósito do David Axelrod e do Cannonball Adderley. O disco dos Tee Set é bonito pela capa, feio pelo disco. Evitem-no. Quanto ao disco do Ranieri (chamado Meditazione e editado na CBS, 1978), comprei-o não só pela capa que é bem bonita mas também porque tem um nome mágico: Eumir Deodato. Como o nome indica, Ranieri é um italiano que canta (em italiano) por cima dos temas compostos por Deodato e tem um som bastante calmo ao longo de todo o álbum. Sendo um disco do Deodato, o álbum não desilude e tem vários momentos de grande inspiração, quase a lembrar os grandes momentos do Prelude (CTI, 1972).

Por último, e não me vou alongar muito neste disco porque o digga vai, de certeza, falar desta colecção num post no futuro próximo, temos uma jóia: o número 2 da pioneira colecção Electro da Streetsounds UK. Neste número 2 temos apenas e só estes clássicos do electro dos anos 80, Al-Naafiysh (The Soul) pelo Hashim [audio], temos o Beat Bop do Rammelzee vs K-Rob [audio], do qual vos vou falar, logo a seguir à parte 2 do post sobre o David Axelrod, temos o White Lines do Grandmaster Flash e Melle Mel. Os outros temas são para encher chouriços? Longe disso que não há chouriços para encher nesta colecção de grande grande qualidade. Mas deixo a dica ao digga e esperemos que ele morda o isco - é que ele tem a colecção completa e pode falar sobre a Streetsounds Electro com outra propriedade.

nota : todos os links com a palavra [audio] à frente contêm um
pequeno sample em mp3 da música de que se está a falar nesse
link.




8/20/2004

BREAK DA SEMANATM : FAITH - FREEDOM




Ok, este é um daqueles casos em que o Google nada tem a dizer. Os Faith parecem ser uma daquelas bandas cuja relevância se perdeu nas brumas da história. Olhando para a capa deste single (e eles têm pelo menos um álbum também) quase que se entende porquê: uma desnecessária carga homo-erótica num contexto rock, uma inclinação natural para o papel de pioneiros do Hair Metal (o disco é de 1973) e... pouco ou nada mais.
Editado na Brown Bag Records, acerca da qual também pouco ou nada se sabe, este single (que eu possuo em edição nacional da Rádio Triunfo) conta com os temas Freedom e Dreamy Eyed Lady. O lado B sugere um grupo rock, com óbvias inspirações na obra de Donovan. Mas o lado A, onde se encontra o break que nos interessa, é puro rock. Freedom conta aliás não com um, mas com dois breaks. Ambos bem depois de o tema ter começado (nem sempre os breaks estão no início dos temas, por isso há que ter paciência!).
E antes de vos deixar ouvir este break, só uma palavra de apreço para o meu amigo Carlos, que me cedeu este single numa troca (e se não fosse pelo break, ele teria ficado a ganhar!).

Freedom break dos Faith! [audio]

PS: Já podem ouvir o break dos Ferro & Fogo e, mais logo, irei colocar online o break para o disco de Jimmy McGriff. Por isso podem consultar os arquivos!



8/19/2004

TRÊS SÍLABAS SINISTRAS: OBRA PRIMA!




Na insuspeita Wax Poetics escreveu-se, a propósito de Three Sinister Syllables, qualquer coisa como “aqui está a nova Cabala. Estudem-na bem!” Percebe-se perfeitamente. Pro Celebrity Golf e Jay Glaze (quer acreditem, quer não, estes são os nomes dos dois génios loucos responsáveis por Three Sinister Syllables na Chopped Herring Records) criaram uma obra prima de Cut n’ Paste que é, ao mesmo tempo, uma espécie de registo exaustivo dos tesouros do Templo do Crate Diggin’ Universal. Confusos? Não estarão após o próximo parágrafo (i hope…).
Actualizando para 2004 a nobre arte do Cut n’ Paste iniciada por gente como Grandmaster Flash no clássico “Adventures on The Wheels of Steel” e prosseguida por devotos discípulos como Double Dee & Steinski (na famosa série das Lessons 1, 2 & 3), Coldcut ou, mais recentemente, pela dupla Shadow & Chemist, Golf & Glaze (é melhor simplificar o esoterismo dos nomes…) criam uma delirante viagem por um mundo de breaks, spoken Word records, loops de discos do leste europeu e excertos de exercícios psicadélicos escavados em Israel e outros locais exóticos. Ao todo são 74 minutos de puro paraíso aural, com centenas de excertos colados com classe e pontaria de campeão olímpico.
O carácter único de Three Sinister Syllables acaba por assentar no facto de Golf & Glaze terem concebido o seu álbum algures a meio caminho entre a tradição Cut n’ Paste e a escola europeia de Diggin’.
Passo a explicar. Embora Golf & Glaze reclamem a herança do Cut n’ Paste logo na capa (o disco é apresentado com uma colagem, com o título a ser composto com letras recortadas ao melhor estilo punk de uma série de discos clássicos de Hip Hop, dos A Tribe Called Quest aos Public Enemy), nunca sacrificam o seu abstracto desejo narrativo ao tecnicismo que por vezes é levado um pouco longe demais neste tipo de discos. Aqui, a música deixa-se respirar, para que se desenrole o fio condutor que dá alma a este disco: uma espécie de sonho molhado de qualquer digger, com breaks atrás de breaks, alguns absolutamente virgens, outros vindos directamente do território fértil do Hip Hop mais alternativo – de MF Doom (toda a terceira faixa lhe é dedicada) a Paul Barman. E esse é o segundo carácter distintivo deste disco. Normalmente as mixtapes ou compilações de diggers limitam-se a alinhar tema raro atrás de tema raro (caso da série Dusty Fingers) ou então são exercícios com o seu quê de masturbatório que alinham originais de temas que causaram furor no meio Hip Hop (ouçam-se as compilações de Soulman, por exemplo). A dupla Golf & Glaze não cai em nenhum dos extremos e prefere equilibrar a apresentação de alguns excertos bem familiares com a exploração de terreno desconhecido, mostrando-nos no processo dezenas de pequenos samples ainda à espera do produtor certo para serem glorificados. Depois é deixar a música respirar sem esquecer os cortes certeiros e precisos, que garantem que haja um groove constante, apesar das contínuas mudanças de rumo. Não há ruído em Three Sinister Syllables. E falo de ruído no sentido de perturbação do conteúdo da mensagem. As colagens são fluidas, perfeitas, calculadas.
Arqueologia sonora, arte pop, Hip Hop, diggin’, coleccionismo, bravado… Está tudo em Three Sinister Syllables de Pro Celebrity Golf e Jay Glaze. Classificação? Obra prima, caso ainda não tenham percebido!



8/17/2004

COISAS DE QUE EU GOSTO Pt. 2



E que tal uma action figure do grande Biz Markie? Um dos maiores diggers de todos os tempos, possuidor de uma lendária cópia de Mardi Gras sem os "cow bells", dono de uma gigantesca colecção que ultrapassa, diz-se, os 200 mil discos... Percebe-se o porquê deste monumento. Mas Biz Markie não é o único a ter uma action figure só sua.


Aos Run DMC também foi dada a honra e existem até vários modelos. Eu já ficaria feliz com este.


E até os Beastie Boys possuem um trio de action figures. Limitadas a 1000 exemplares, parece que trocam agora de mãos por quantias astronómicas.


Mas nem só de action figures vive o homem. Este é o Flamingo, modelo de gira-discos portátil produzido pela Sony nos anos 80. Não é tão bom como o Sound Burger apenas por uma razão: não possui braço, logo não se pode colocar a agulha naquele ponto específico para conferir se há ali ou não um break. Ainda assim, é um objecto impressionante.


Air Force One New York City... Huuuuum. Mi gusta.


DIGGIN' SPOTS: O SEGREDO É A ALMA DO NEGÓCIO



Num blog como o Hit da Breakz partilha-se muita informação, dão-se alguns pointers e, porque não dizê-lo, revelam-se alguns segredos. Significará isso que deveremos revelar todos os segredos? A verdade é que nesta cultura de coleccionismo específica há muito que o secretismo desempenha um papel importante.
Primeiro foram os selectahs jamaicanos (os equivalentes aos DJ's) a apagarem as rodelas dos seus singles importados dos Estados Unidos para que os operadores de Sound Systems rivais não descobrissem quais as suas armas secretas que melhor funcionavam na pista. Essa atitude foi depois reclamada pela nascente cultura Hip Hop naquela fase formativa em que o DJ valia não só pelos seus ainda incipientes skills, mas, sobretudo, pelos breaks exclusivos que tirava da sua crate para manter os B-Boys na pista. Gente como Afrika Bambaataa e Kool Herc trocavam as voltas aos espiões com uma série de truques como a remoção das etiquetas (usando água morna), colocação de autocolantes em cima das etiquetas ou, em casos extremos, utilização de capas e etiquetas falsas para certos discos importantes de forma a fornecer pistas erradas à concorrência.

Este secretismo pode parecer risível hoje - embora a cultura DJ em geral, e não apenas o Hip Hop, tenham herdado dessas atitudes primordiais algumas marcas... - mas há que entender que tanto no caso da cena jamaicana de Sound Systems como nas festas pioneiras do Bronx ao público não interessava tanto o culto da personalidade do DJ, como a música que saía das colunas. Um bom set arrancava aplausos. Um mau set colocava o DJ em maus lençóis.
Foi nessa época que o Diggin' - por alguns apontado como o 5º elemento do Hip Hop, depois do MCing, DJing, B-Boying e do Graffiti - tomou forma. Os aspirantes a um lugar no palco dos DJ's eram obrigados a fazer trabalho de casa e a gastarem horas incontáveis em caves de lojas ou em sotãos de familiares à procura não só dos breaks clássicos que garantiam sempre resultados, mas de novos breaks que lhes pudessem estabelecer o nome.
Claro que com o aparecimento dos primeiros samplers a cultura do Diggin' disparou. Os breaks deixaram de ser preocupação exclusiva dos DJ's e passaram a ser uma necessidade dos produtores. Até hoje. Claro que nesta nova realidade o secretismo e o carácter exclusivo de certos discos justificava-se ainda com maior intensidade. Já não se tratava de ser o único a ter determinado disco para agitar pessoas numa pista de dança, mas de ser o único a ter determinado break ou sample que pudesse transformar uma música num sucesso de vendas. E esse secretismo todo paga-se. Há histórias de dealers de discos nos Estados Unidos que, ao longo dos anos, se especializaram em fornecer DJ's e produtores de Hip Hop. E quando surge um disco de que nunca ninguém ouviu falar, mas que tem um break ou um sample enorme capaz de transformar um tema num grande sucesso há que pagar para o obter. Diz-se até que certos produtores de primeira linha pagavam não apenas para obter discos assim, mas igualmente para, caso outras cópias surgissem, que nenhum outro produtor o pudesse adquirir. Pelo menos durante algum tempo...

Claro que esta é a realidade americana: ultra-competitiva e onde um segredo tem um valor diferente por haver literalmente milhares de pessoas atrás de cada pedaço de informação. E não apenas "fellow diggers", mas também advogados e caçadores de direitos de autor variados.
Voltamos à pergunta inicial: deveremos nós aqui no Hit da Breakz divulgar todos os segredos? Muito bem, penso que a principal missão deste Blog é, como já expliquei, a partilha de alguma informação - discos que nos apaixonam, histórias curiosas, breaks históricos, etc... Mas isso não significa que estejamos prontos para revelar, por exemplo, os nossos spots secretos para o Diggin'. Já recebemos emails a perguntar coisas como "além das Cash Converters e da Feira da Ladra onde posso eu comprar discos?" Ser um digger significa também dar trabalho às sapatilhas, fazer alguma investigação de detective. Já encontrei alguns spots em Lisboa apenas por gostar de deambular por ruas desconhecidas. Há sempre uma casa de velharias, um antiquário ou um alfarrabista que nunca se tinha visto antes que tem por lá uns discos. Por isso, não me parece que, pelo menos para já, possam ler por aqui no Hit da Breakz listas exaustivas de locais priveligiados para a compra de discos. Mas a leitura atenta destes textos revelará pistas aos diggers mais devotos. Já por aqui falámos nas feiras do Concelho de Oeiras (Oeiras, Paço de Arcos e Algés, respectivamente no primeiro, terceiro e último domingo do mês). Há feiras de velharias noutros locais, como Belém ou a Parede. Fora de Lisboa há Setúbal, Azeitão, Coimbra. E para lá das feiras há uma rede imensa de lojas de inutilidades (o que os americanos chamam Thrift Stores) que vendem livros velhos, mobília antiga e louça usada que, num cantinho, têm sempre uma caixa com alguns discos. Eu conheço algumas dezenas de sítios assim. E descobri-os das mais variadas maneiras, mas sobretudo a explorar. Deixo aqui um desafio para que façam o mesmo.

Tendo dito tudo isto, fica aqui um Top 5 de Diggin' Spots para explorar:

01 - Feira de Velharias de Algés (último domingo do mês)
02 - Cash Converters de Benfica
03 - Discolecção (escadinhas do duque, lx)
04 - Feira de Velharias de Belém (primeiro domingo do mês)
05 - Remar de Campo de Ourique




8/16/2004

BOLLYWOOD A GO GO



Como seria possível resistir a uma capa assim? Um tipo chamado Charanjit Singh a tocar Instrumental Film-Tunes? "Quanto é?" foi a pergunta que eu coloquei imediatamente, como é óbvio.
Depois de chegar a casa e colocar o disco no prato obtém-se um resultado no mínimo desconcertante. Este álbum é bom, mas... Como explicar?... As músicas são dominadas por instrumentos exóticos com nomes como Transicord e Claviolin (que soam como filhos bastardos resultantes do cruzamento em laboratório de Moogs e orgãos de brincar) e parecem ser as últimas sobreviventes de uma espécie de Lounge Music feita especialmente para Sultões que tomavam ácido. O estranho disto tudo é que a data do disco - 1975!!! - e a capa fizeram-me pensar em Bollywood Disco, mas, nem sinais de bolas de espelhos. Se por alguma razão inexplicável a Riviera Francesa dos inícios dos anos 60 tivesse sido transplantada para os arredores de Calcutá, esta música seria o que se poderia escutar em cada café ou esplanada.
O álbum está cheio de belos loops e há por aqui muito material samplável, embora nada de breaks, como já deve parecer óbvio. As versões de temas principais de filmes como Khushboo, Khel Khel Mein, Dharam Karam e Woh Kaun Thi só nos fazem perguntar como seriam essas pérolas cinematográficas...
As boas notícias, no meio disto tudo, é que depois de anos a encontrar sempre as mesmas cópias da banda sonora de Bobby, parece que, finalmente, começam a surgir por aí exemplares mais interessantes de música de filmes de Bollywood. Ainda bem.

PS: Fica aqui uma amostra deste LP a pedido do Dub! [audio]


HIT DA BREAKZ PREOCUPADO COM ATENAS 2004


Com o início dos Jogos Olímpicos, o hit da breakz não podia deixar de se aliar a este enorme evento desportivo. No entanto, é com alguma preocupação que notamos o aproximar do início das competições de atletismo. É que, com esse início, fica bem perto o início da prova de lançamento do disco e, com ele, a destruição de mais uns quantos discos de vinil. Não dá para em vez de fazermos o lançamento do disco, fazer, sei lá, o lançamento de cadeiras? Tem mesmo que ser discos? Qual é o interesse de lançar discos de funk a 70m, hein?


Lançador nos Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000, prepara-se para lançar mais um disco de funk. Por sorte, este nem é muito bom: é um disco dos Commodores na sua fase mais chatinha. Nos últimos Jogos, calcula-se que tenham sido destruídos, entre sessões de treino e competições oficiais, mais de 100.000 45 rotações de funk.



8/14/2004

MAD-DOOM DIGGIN' COMICS


Madlib e o mega vilão MF Doom (que está no novo single dos De La Soul, cujo álbum deverá sair em finais de Setembro, yum yum!) numa aventura de Crate Diggin' DC Superhero stylee. Está no site da Stones Throw.





8/13/2004

BREAK DA SEMANATM : BWANA - CHAPUMBAMBE




Um dos discos mais importantes numa colecção de breaks tem de ser o Bwana. Editado pela Caytronics (quem?) em 1972, é um disco de uma qualidade impressionante, extremamente consistente e com um som onde o rock e o funk e o som latino/afrocubano se misturam tão bem que parecem irmãos - e, no fundo, até são. Outra razão para a sua importância é a raridade. É muito difícil arranjar um Bwana original, principalmente um em boas condições. Basta dar um pulo até ao site do Oliver Wang, um dos mais conceituados jornalistas e críticos de todo o fenómeno hiphop, para verem como este é um dos grandes problemas mundiais, a merecerem rápida intervenção das Nações Unidas : arranjem cópias originais do Bwana em bom estado para toda a gente! Eu até nem me posso queixar muito, estou a falar de barriga cheia. A minha cópia do Bwana vem fechada, nova, imaculada, nunca antes ouvida e em excelente estado. "Nesse estado, só pode ser uma reedição!", dizem vocês. Mas não. É mesmo original. Consegui arranjar um Bwana fechado, num absoluto golpe de sorte, e chegou-me esta semana, como o digga já tinha dito mais abaixo.

Ora bem, apresentados que estão os leitores com o disco e após ouvirem o link que se encontra no fim deste post, provavelmente muitos de vocês quererão também ter o Bwana na vossa colecção. Opinião de que eu partilho: o Bwana devia estar em todas as colecções de diggers, não só porque é o holy grail que é mas também porque é um disco muito bom. Por isso, se quiserem arranjar um Bwana, aconselho-vos a comprarem a reedição que é fácil de arranjar (está à venda na Dustygroove e na Turntablelab, por exemplo). Não paguem mais do que 10-20 dólares por ela, caso comprem noutros lados, que é um preço justo pela reedição. Já o original vai ser um bocado mais complicado de arranjar a um preço tão convidativo. A última cópia do Bwana que apareceu na eBay foi por 170 dólares, sensivelmente, e estava num estado lastimável, quase semelhante ao do disco que o Oliver Wang apresenta. A minha cópia fechada não custou nem de perto nem de longe isso e foi comprada a um dealer de discos de rock psicadélico (um género que pouco tem a ver com o Bwana, o que pode explicar o excelente preço que consegui) por isso, e como os preços do Bwana são tão flutuantes (que o são), tenham atenção a eles e não paguem demasiado.

E agora vamos ao break. O break que escolhi do Bwana foi o Chapumbambe [audio] mas podia ter escolhido outro qualquer. Mas este foi o que, ao primeiro impacto, me impressionou mais.


nota : o link com a palavra [audio] à frente contem um pequeno
sample em mp3 da música de que se está a falar nesse link.


JAZZY JAY OU COMO SE FAZIA NO ANTIGAMENTE


Continunado a conversa dos breaks, fica aqui o link para um video onde podemos ver o DJ Jazzy Jay, um dos djs originais da Zulu Nation de Afrika Bambataa, a fazer uma demonstração de dj.

Nela, podemos ver a técnica que referia de prolongar o break. Reparem que Jazzy Jay tem, a determinada altura, dois discos iguais em cada prato e o que ele faz é prolongar o break, deixando tocar alternadamente a cópia 1 e 2 do disco.

E é sempre importante ver como é que os djs pioneiros do hiphop manipulavam os discos. Uma coisa é falar sobre isso, outra é podermos ver e ouvir Jazzy Jay a tocar. Dá-nos mais um pequeno pedaço do puzzle que é a história do hiphop.
este link é em Real Media e precisa do Real Player para ser visto



BOOM BAP: GIVE THE DRUMMER SOME


A propósito do excelente e ultra-gráfico texto do Dub sobre os breaks, calha bem ir recuperar mais um texto de RMA, este para a OP (2002), que explora a mesma ideia do break, mas de um ponto de vista mais "teórico"...

Boom-Boom-Bap!


A bateria é o mais político de todos os instrumentos. Em primeiro lugar, porque retém uma ancestralidade que mais nenhum instrumento possui, afirmando-se, por isso mesmo, como uma marca de identidade. Porque, enfim, fala a única linguagem realmente universal: os padrões rítmicos repetitivos, mais do que os melódicos, têm a idade do Homem. Antes das primeiras palavras terem ganho forma, foi no acto primitivo de chocar pedra com pedra, madeira com pedra, madeira com madeira, ou madeira com pele que vibraram os primeiros sentidos profundos de uma linguagem sónica que ainda hoje perdura. Não deixa por isso de ser significativo que, impresso bem fundo no código genérico da nova realidade digital, esteja o pulsar dos tambores, que de África para o Novo Mundo se alargou, por via das modernas tipologias musicais, a um Velho Mundo que não entendeu os tambores quando foi colonizador, mas que a eles se rendeu quando foi cultural e musicalmente colonizado.

O que há afinal num break de bateria? O que se houve no "boom-bap" de um break suado que quando repetido num loop nos transporta para uma outra dimensão? História, poderíamos dizer. Ancestralidade. O som primevo das margens do Nilo... num disco de DJ Shadow. Perante esta perspectiva, o sampler funciona como uma espécie de entrada para uma dimensão alternativa, um portal cósmico. Um artefacto mágico que, quando bem usado, retém a identidade do som de bateria original, ainda que, ao mesmo tempo, permita a transfiguração desse padrão primeiro até ao infinito. O B-BOOM-BOOM-BAP/B-B-BOOM-BAP de "Zig" Modeliste (o baterista do mais zen de todos os grupos funk, os Meters) pode ser reconfigurado num B-B-BAP-BOOM-BOOM/BOOM-B-B-B-BAP, quando se transformam os sons acústicos em bem disciplinados zeros e uns dentro do sampler, e se cortam, como se tivéssemos à mão uma tesoura, os sons individuais do kit de bateria, para se reconstituir um novo mapa de pulsões, a partir de coordenadas antigas.

Provavelmente, o mais emblemático de todos os breaks de bateria foi assinado por Clyde Stubblefield, quando, enquanto parte da secção rítmica de James Brown, assinou momentos históricos em temas como "Cold Sweat" ou, principalmente, Funky Drummer. Concentrando-se no bombo, na tarola e no hi-hat, Clyde responde ao apelo de James Brown ("let’s give the drummer some...") e, num longuíssimo break (que não é um solo...), inventa a música moderna, soando como se de um metrónomo humano se tratasse. O sofisticadíssimo desenho rítmico na tarola e a segurança do seu trabalho de pés no bombo e no hi-hat pode ser encontrado em centenas de discos de hip hop ou, acelerado, como parte da revolução drum n’ bass.
"Funky Drummer" é um disco de 1970. À época, James Brown usava os seus concertos ao vivo como o combustível da sua inspiração. Talvez para poupar dinheiro nas incontáveis horas de estúdio que uma banda pode queimar até estar "no ponto" para gravar, o Padrinho da Soul costumava terminar um espectáculo e levar imediatamente a sua banda para as imediações do gravador mais próximo. Nesses dias, a América profunda atravessava uma revolução da consciência. O Civil Rights Movement e as vozes aparentemente opostas de gente como Martin Luther King ou Malcolm X ainda ecoavam nas paredes das grandes cidades. James Brown era um músico no centro do turbilhão. Uma verdadeira estrela com uma visibilidade que interessava a todos os campos desse conturbado mapa político. Na segurança extrema dos seus músicos, o homem de "Sex Machine" reflectia a sua própria disciplina: uma disciplina de auto-afirmação, a única via que, segundo a sua opinião, poderia conduzir à elevação do Homem Negro.

E Stubblefield, naqueles segundos preciosos de "Funky Drummer", quando toda a banda se remete ao silêncio e as peles tensas da sua bateria fazem vibrar o ar no estúdio, envia a todo o mundo uma mensagem: "Nós estamos aqui há muito tempo. Já construímos grandes civilizações. Durante 500 anos fomos oprimidos, violentados... Mas agora chegou, de novo, a nossa hora. Chega!" E na precisão sincopada daquele break lê-se a História de uma diáspora forçada, das terras quentes de um grande continente negro onde o tambor sempre transportou ideias até às margens de um Mundo Novo que durante séculos não soube reconhecer dignidade num povo. Um povo que nunca abandonou os seus
tambores e que os usou ainda nas plantações para codificar ideias e reforçar laços de identidade. Que essas ideias sejam, décadas mais tarde, filtradas pelo processador de um sampler nas mãos de um jovem negro ou branco, na América ou na Europa, só vem reivindicar, de novo, a universalidade dessa vibração primordial. "A bateria," dizia a canção, "é o instrumento mais importante."*

* "The drum is the most important instrument..." US 3 in "Different Rhythms, Different People".


8/12/2004

BREAKS - PORQUE É QUE SÃO TÃO IMPORTANTES?


A pergunta que alguns de vocês podem estar a fazer é "Que raio é um break?". Um break é aqueles gloriosos segundos de um tema em que os instrumentos todos se calam para dar voz apenas e só à bateria e a quem está sentado atrás dela - o baterista. Resumindo, é um solo de bateria. Como devem saber, não é um momento que seja habitual em todas as músicas, por isso, encontrar uma música que contenha um break é sempre razão para felicidade.

"Mas felicidade porquê?". Por várias razões mas vou referir apenas as duas que acho que são as mais importantes.

A primeira razão tem a ver com a vertente do disc jockey (o dj). O dj, sabendo que um disco - chamemos-lhe o disco A - sabendo que o disco A tem um break, pode, tendo duas cópias do disco A, estender o break até ao infinito se quiser. Como? Mete o break a tocar num prato e depois, quando esse break acabar, mete a segunda cópia a tocar, com o break no seu início. Quando o break chegar ao fim na segunda cópia, toca a meter o mesmo break da primeira cópia (que entretanto foi "puxado" atrás até ao início do break) a tocar. E quando este acabar, volta a meter a segunda cópia outra vez a tocar... e assim sucessivamente. Isto visto ao vivo faz mais sentido pelo que vos encorajo a irem ver um dj de hiphop a actuar. É que, para além destes truques, os djs de hiphop são os djs que, em todos os estilos musicais, mais domínio têm sobre os pratos, fazendo truque atrás de truque atrás de truque (o que chamamos de turntablistas, do inglês turntable ou prato)



Porque razão só o break é prolongado? Não houve ninguém que se sentasse tipo Conselho de Ministros e decidisse que só os breaks seriam prolongados. Foi tudo uma questão de prática e de observação da realidade. Os djs pioneiros do hiphop, quando o hiphop ainda não se chamava hiphop - Kool Herc, Jazzy Jay, Grandmaster Flash - chegaram à conclusão, pela sua experiência enquanto djs, que as pessoas dançavam mais freneticamente quando os breaks tocavam. Só que, tendo os breaks a maioria das vezes, pouquíssimo tempo, rapidamente os outros instrumentos voltavam a encher a música e as pessoas (os bboys originais) ficavam com pena que o break tivesse acabado. Assim, os djs, através da técnica das duas cópias do mesmo break, prolongavam esse break durante mais tempo, permitindo que a dança acontecesse durante mais tempo também e, com ela, o prazer de quem dança. E tudo em tempo real, com uma manipulação manual dos discos e não, como hoje é possível, através de edits de computador ou, com estes novos processadores de efeitos, carregando apenas num botão.

A segunda razão para os breaks terem a importância que têm tem a ver com os produtores de música, com ênfase nos produtores de hiphop. Como disse antes, o break é um pedaço do tema em que só a bateria fala. Ora isto tem uma importância vital para quem sampla, para quem usa sons de outras músicas para criar uma música nova e original. Assim, para quem sampla o som das baterias, é importante que não esteja a tocar mais nenhum instrumento. A razão é simples: quando samplamos o som de uma bateria, pretendemos substituir, através do sample, um baterista. É como ter o baterista do James Brown em casa : se samplarmos o som da sua bateria, temos um dos melhores bateristas do mundo a tocar num disco nosso. E como só queremos o baterista e não o trompetista ou o baixista do James Brown, interessa que só tenhamos o som da bateria. É aqui que entra o break - permite que quem sampla consiga obter apenas o som da bateria.



Na foto em cima, podemos ver DJ Shadow com um disco no prato e com uma MPC 3000 (o rei dos samplers no hiphop - a sigla MPC esconde o nome MIDI Production Center - e é o aparelho que está por baixo da sua mão direita), pronto a transferir os sons de um break para a MPC. Se repararem, a MPC tem uma série de botões (os pads). Os pads são os 16 botões cinzentos que encontramos no centro da MPC, formando um quadrado de 4 botões cinzentos por 4 botões cinzentos. Poderão ver melhor os pads na foto em baixo (é uma MPC idêntica à que o DJ Shadow está a usar).



Quando o break é samplado, é possível ao produtor dividir o break em pedaços mais pequenos. Assim, sampla primeiro o bombo, depois a tarola, depois o hihat, depois o prato de choques, o címbalo e por aí fora. Depois, cada som é destinado a um botão, a um pad. E é desta forma que o produtor vai, através da MPC, poder "tocar" bateria. Toca no pad 1 e tem o bombo. Toca no pad 2 e tem a tarola. Agora mais rápido... pad 1, pad 2, pad 1, pad 1 , pad 2... e a sair pelas colunas temos : boom bap boom boom bap.


ORIGINAL VS REEDIÇÃO


Muitas vezes sou confrontado com a seguinte frase: "Oh Dub, porque é que tentas arranjar originais se há reedições?". É uma questão aparentemente simples mas que se torna muito complexa, se a separarmos em todos os seus elementos.

O diggin', a maior parte das vezes, é tentar encontrar discos originais a preços baratos. Geralmente conseguimos verdadeiros milagres nas lojas, comprando discos que a preços de mercado valem 20, 30 contos (100, 150 euros, pronto) por 1, 2 euros. O exemplo mais recente que tenho é do single de italo dos B.W.H., que comprei numa loja de coisas em segunda mão pela módica quantia de 0.50 cêntimos, em excelente estado (novo!, nem sequer estava maltratado como é costume os singles de música de dança dos anos 80 estarem, após uso e abuso por parte dos djs - como o digga referiu no post mais abaixo). O disco, que me custou 0.50 cêntimos, custar-me-ia 100 euros se o comprasse numa loja da especialidade. Isto se o tivessem à venda, claro, o que nunca acontece, tão escasso que é o disco. Foi sorte!

Mas divago. Estava a dizer que o diggin' é tentar encontrar discos originais a preços baratos. Porquê originais? Porque é raríssimo encontrar reedições nos escaparates de lojas em 2a mão, que são o terreno de eleição dos diggers. As reedições limpinhas e bonitinhas encontramo-las nas lojas de música. E encontramos aqui uma das respostas para a pergunta inicial: porque é que eu vou dar 20 euros por uma reedição em CD quando posso ter o original em vinil por 1 euro?

Bastava a razão económica para calar a inquisição mas a música é mais do que o dinheiro que a pode comprar. Até porque há muita coisa que não aparece nas lojas em 2a mão, principalmente discos mais obscuros que raramente aparecem nos seus países de origem, quanto mais em Portugal. Onde é que em Portugal vou encontrar um Bwana, por exemplo? (vai ser o BREAK DA SEMANATM por isso estejam atentos a este verdadeiro holy grail do digging). Ou um Peace & Love, um disco que mistura rock psicadélico, algum funk e tudo com um sabor verdadeiramente mexicano? Se nem os discos mais banais costumam aparecer, quanto mais estas raridades?



Assim, para ter estes discos comigo, terei de os comprar em vinil original já que nem um nem outro se encontra reeditado para o mercado português - acaba aqui a conversa do original vs reedição, tem mesmo de ser original. E entre mandar vir de fora um disco original ou um disco reeditado, acho que é do interesse de todos mandar vir um disco original. Mas será que podemos sempre escolher?

Voltamos novamente ao lado económico da questão: será que o preço dos originais ou das reedições é sempre favorável aos originais? Faz algum sentido, económico ou racional, pagar mais por algo usado do que por algo novo quando ambos produzem exactamente o mesmo resultado - o mesmo som?

A resposta para a primeira pergunta é "não". Há originais (e é esta a norma) que são mais (mas muito mais) caros do que as reedições. E isto explica-se facilmente: só faz sentido reeditar algo que as pessoas não tenham, nunca algo que as pessoas consigam comprar facilmente. Não faz sentido reeditar discos que venderam milhões de cópias (apesar de haver reedições do Rapper's delight dos Sugarhill Gang mas são excepções).

Vamos dar como exemplo um disco que foi reeditado recentemente : o Fohhoh Bohob dos Patron Saints.



É um dos discos mais raros de todo o rock psicadélico - só foram produzidas 100 cópias, em 1969, deste disco, gravado na sala de estar dos pais de um dos elementos. É um disco que não tinha pretensões nenhumas a ser o que é: um monstro do rock psicadélico, não só pela sua originalidade mas também pela sua ingenuidade. Nenhum dos moços da banda sonhava um dia que o seu disco iria trocar de mãos por valores a aproximar os 3000 dólares (600 contos), no entanto, se não aparecer, num golpe de sorte inacreditável, numa qualquer loja em 2a mão que não faça a menor ideia do que aquilo é, o preço do disco é mesmo esse: 3000 dólares.

Eu não tenho 3000 dólares para dar por um disco. 3000 dólares é muito dinheiro. No entanto, há muita gente que troca facilmente esse dinheiro para ter em casa um disco destes. E convenhamos, é quase como comprar um quadro só que em vez de darmos valor às paisagens ou ao traço, damos valor ao som. Mas dar 3000 dólares por um quadro de um pintor (e por 3000 dólares não é assim tão tão importante) não é insultuoso enquanto que se disser que dei 3000 dólares por um dos 100 discos mais importantes do rock psicadélico, cai o Carmo e a Trindade e a Sé Velha em Coimbra ao mesmo tempo. Ou seja, é tudo relativo. Relativo à carteira, relativo ao interesse que temos no disco, é tudo relativo. Mas por muito relativo que seja, neste momento, não consigo relativizar 3000 dólares para fora da minha conta bancária. Mas gostava de ter o disco. Como resolvo este dilema? Com reedições.

Com as reedições a terem cada vez melhor qualidade, e como aconteceu no caso da reedição do Fohhoh Bohob, apadrinhadas que são pelos artistas originais, que fornecem as masters para serem trabalhadas digitalmente, que acrescentam músicas originais nunca antes publicadas, que acrescentam booklets espantosos com informação preciosa dada pelos membros das bandas, a velha questão do "original vs reedição" está lentamente a transformar-se numa outra questão bem bem diferente. É que, com esta crescente qualidade nas reedições, o que provavelmente vai acontecer é que as reedições vão ser tão importantes como os originais e não seus substitutos.


8/11/2004

BWANA?




Alguém recebeu este Holy Grail na caixa de correio muito recentemente... E o meu instinto diz-me que dentro de pouco tempo se vai poder ler por aqui tudo o que há para saber sobre este misterioso disco. Certo, Dub?




JAMES BROWN: FUNKY DRUMMER 12"




Recentemente, eu e o Dub efectuámos uma curiosa expedição de Diggin'. Depois de algum trabalho de detective - que se seguiu após uma intrincada sequência de referências cruzadas que incluiram alguns discos trocados com um grande amigo (entre eles um álbum dos T-Connection e um maxi fabuloso de Roy Ayers, o "Running Away) e uma sessão de DJing numa histórica casa nocturna de Lisboa - descobrimos então que esse tal clube estava a vender a colecção de discos. Como já suspeitávamos e acabámos por descobrir, vinte anos de trabalho não deixam os discos em grande forma (ainda por cima quando usados por DJ's que não são os seus legítimos donos - ou seja, deviam ter tanto cuidado com eles como aqueles motoristas que conduzem taxis de que não são proprietários...). Ainda assim, a viagem, a poeira e o calor terrível que se fazia sentir naquele sotão valeram bem a pena.
Entre os discos do meu lote vieram vários LP's de James Brown (obrigado Dub!), nomeadamente o fabuloso Hell, mas foi um maxi da Urban, de 1988, que fez as minhas delícias.
Este maxi foi recentemente reeditado e não tem um valor por aí além, mas trata-se de um disco que eu já perseguia há uns 15 anos, depois de o ter visto nas mãos de um DJ num clube do Bairro Alto (os 3 Pastorinhos, para ser mais preciso). Além da versão original do fabuloso tema Funky Drummer, este maxi inclui um pequeno edit deste mesmo tema da autoria de Danny Krivit (ler mais abaixo!). Esse edit é como se fosse o recheio de um bolo fabuloso: ou seja, trata-se do monstruoso break do génio Clyde Stubblefield repetido em loop, perfeito para criar um crescendo num set, por exemplo. "Funky Drummer" foi originalmente editado em 1970 e nos 34 anos do seu reinado rítmico não perdeu nem um grama de força.
A edição deste maxi em 88 não foi inocente, uma vez que boa parte da produção Hip Hop de 1988/1989 se apoiou no loop de "Funky Drummer" (e não só... lembram-se dos Soul II SOul?).
Enfim, trata-se de um momento dourado na história da música do século XX. Um momento que deveria existir - em vinil, CD, cassete, DAT, mini-disc ou seja lá qual fôr o formato - em todas as casas de todo o planeta. Como isso deve ser uma tarefa impossível, tratem mas é de arranjar um exemplar para a vossa casa!