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HitdaBreakz

3/22/2008

Rub-N-Tug: That Kind of Party



Eric Duncan e Thomas Bullock são Rub-N-Tug, herdeiros modernos de um espírito singular nascido no Loft de Nova Iorque. Autores de compilações de referência e culto crescente, Rub-N-Tug já deixou marca na música de gente tão diferente como Coldplay ou Beastie Boys.


David Mancuso inventou Nova Iorque no seu Loft, criando uma utopia com a alta definição das suas Klipschorn e uma cuidada selecção musical que privilegiava uma certa espiritualidade em detrimento da funcionalidade exigida pela pista de dança. Das festas Love Saves The Day de 1970 até aos dias de hoje vai muito mais do que a simples distância das décadas. O Disco pode ter beneficiado da visão de Mancuso, mas o gesto de Travolta simbolizou uma nova ordem de escala planetária que já não contemplava lugares de intimidade desarmante como o Loft. Depois do Paradise Garage, o Disco esmoreceu até que, a partir de Chicago e Detroit, outros pulsares redefiniram o mundo. Com o tempo, dançar a partir das escolhas de um DJ tornou-se no gesto em que se apoia toda uma indústria que debita mix-CDs e DJ-stars com a cadência própria de uma bem oleada linha de montagem. Nova Iorque passou a ser um lugar quase imaginado, preso à realidade por ideias isoladas, como o Body and Soul, que nunca negaram ter o Loft como miragem permanente.

Eric Duncan e Thomas Bullock – Rub-N-Tug – não esqueceram essa Nova Iorque, mesmo não estando lá em 1970 a ajudar David a encher os balões que decoravam o Loft.

"We're into having a party. Music and having a drink and a good time. Our friends and family in New York all kind of gathered about us when we started to play jams. The first Rub-N-Tug night was a loft jam at the AsFour Siver Cage - a crazy night with 40 cases of champagne on the fire escape, fights broke out while we scratched records. At one point T played the keyboard with his bare ass. You know that kind of party. That's how it started; may it continue as it began." – Rub-N-Tug

Como muito bem explicou José António Moura no texto que assinou a propósito da passagem de Rub-N-Tug pelo Lux em 2007, as relações pessoais são o verdadeiro motor da ideia de Eric Duncan e Thomas Bullock, gesto revolucionário de regresso à essência numa época de calculadas associações. Mas tal como no Loft de Mancuso, que se impôs como uma festa privada que só aceitava novos frequentadores por convites directos de membros estabelecidos, a rede de relações Rub-N-Tug surgiu como uma forma de reinventar a cidade e de redescobrir a própria música.
O primeiro encontro de Eric e Thomas aconteceu em Los Angeles, mas a atracção da Big Apple era irremediável. Quebrando as regras e criando atalhos, Eric e Thomas rapidamente se encontraram num Loft (claro…) que antes havia sido um salão de massagens chinês, um… rub and tug. E as festas começaram a atrair as atenções de quem ainda procurava ecos da tal ideia perdida de Nova Iorque.

Ao ignorarem o livro de estilo dos DJs modernos em “Campfire”, a colectânea com que Eric e Thomas alinharam pelo caminho redescoberto por Dj Harvey em 2001 (com a compilação “Sarcastic Disco”), Rub-N-Tug encenaram, de forma simbólica, um regresso à Nova Iorque primordial com a música e a atmosfera genuína construída pela tal rede pessoal de amizades a ocuparem o centro das atenções e das intenções. E voltou-se a pensar em Disco não como um género, mas como um verdadeiro lugar – uma pista – onde a música comanda as suas próprias ligações, de forma orgânica e sem necessidade da observação de códigos feitos de bpms ou de concordâncias estéticas: Aphrodite’s Child, Bronx Dogs, Patrick Adams, Cozy Powell e Daniel Wang… Diferentes épocas, géneros, nacionalidades… Diferentes. Descontínuos. Desligados. Errados. Mas absolutamente vibrantes, como se supõe que eram as festas Love Saves The Day.

Uma passagem mais assumidamente “housy” pela série Fabric (número 30) não interrompeu a demanda singular de Rub-N-Tug que em “Better With a Spoonful of Leather” desacelerou o pulsar da pista até ao hipnótico balançar em gravidade zero preconizado por Beppe Loda e Daniele Baldelli. Em comum, a procura de uma abordagem distinta à arte de encadear discos em frente de pessoas.

O ano passado e após uma longuíssima espera que gerou delirantes especulações, Thomas e DJ Harvey editaram um álbum na Whatever We Want. Map of Africa fantasia o Rock como Rub-N-Tug fantasia Nova Iorque. E de uma forma tão inteligente que se demarca de qualquer tentação revisionista. «Map of Africa», o LP, foi editado sem qualquer foto promocional da “banda”, sem qualquer entrevista ou vídeo-clip, sem um único concerto ou qualquer outra coisa que não a música. Rub-N-Tug também é assim: o melhor segredo que conhecemos, o melhor cartão de vista de uma Nova Iorque que não existe nos roteiros ou nas páginas das revistas. Só no centro da pista de dança, naquele preciso momento em que o disco certo sucede ao que nos parecia ser errado.

Texto publicado originalmente na revista Blah Blah Blah do Lux a propósito da última vinda de Rub-N-Tug a Portugal.