1/01/2008
Jazz Bridges # 8: Azymuth do Brasil

Serve esta longa introdução para dizer então que os brasileiros Azymuth, mestres de uma forma muito particular de jazz de fusão, não eram propriamente uma anomalia exótica na história da música brasileira quando surgiram no início da década de 70. O seu primeiro álbum enquanto Azymuth, sem título e editado em 1975, foi agora alvo de uma interessante reedição por parte da londrina Far Out, etiqueta que muita atenção tem dado à produção do Brasil e que na última década se assumiu como nova casa de artistas tão importantes como Marcos Valle, Joyce ou… Azymuth. E esse primeiro álbum é, claro, uma pequena pérola que bem poderia cair dentro do que Ed Motta identificou como MPBHR – Música Popular Brasileira de Harmonia Rica.
Os Azymuth de José Alexandre Malheiros, Ivan Conti (ou Mamão, como é mais vulgarmente conhecido) e José Roberto Bertrami começaram por produzir sessões para grandes nomes da música brasileira como Tim Maia, Raul Seixas e Marcos Valle, entre outros. Foi aliás Paulo Sérgio Valle, irmão de Marcos, que sugeriu que o trio passasse a responder pelo nome de Azymuth após a gravação da banda sonora de “O Fabuloso Fittipaldi” onde se incluía uma faixa com esse mesmo título… A palavra azimute tem origem no árabe e significa caminho ou direcção, facto curioso que cai como uma luva na personalidade deste trio que soube desenhar um trajecto muito singular na história da música brasileira.
“Azymuth”, o álbum de 1975, é um brilhante pedaço de música que cruza marcas óbvias do jazz de fusão – por exemplo ao nível das texturas: Bertrami utilizava interfaces cósmicos como o piano Fender Rhodes e os sintetizadores Moog e Arp, ferramentas que Herbie também não dispensava nesse tempo – com o particular sentir harmónico e rítmico da Música Popular Brasileira referenciando de forma óbvia o que alguns dos cantores mais populares e avançados do seu país (Milton, Gil, Caetano…) realizavam à época e a que Joyce chamou MCB – Música Criativa Brasileira. A reedição de “Azymuth” vem acompanhada de um segundo CD de remisturas e re-edits por parte de gente valorosa como Harmonic 313, Recloose, As One (outro herdeiro assumido do jazz de fusão dos anos 70), Marc Mac dos 4 Hero ou Peanut Butter Wolf, dono da editora onde Madlib, protagonista do último Jazz Bridges, edita o grosso da sua obra. Ora Madlib não só tem preparado para breve um álbum de homenagem aos Azymuth (facto que certamente explica a sua ausência do alinhamento destas remisturas), como contou com a participação do baterista Mamão no projecto Yesterdays Universe. O impacto da obra dos Azymuth numa nova geração de produtores de música de raiz electrónica é inegável. Esse facto explica-se, obviamente, com a própria música criada pelos Azymuth que na sua devoção pelo groove e na exploração de texturas electrónicas já continha óbvias sementes de futuro. Os Azymuth gravaram mais uma série de álbuns muito bons (incluindo vários para a norte-americana Milestones), mas esta é a primeira vez que “Azymuth” se reedita fora do Brasil e o Jazz Bridges não podia deixar de sublinhar tão importante facto.
Texto originalmente publicado na revista Jazz.Pt