<$BlogRSDUrl$>
.

HitdaBreakz

9/11/2007

Pete Herbert à conversa



Todas as histórias têm um início, por isso, se calhar é por aí que damos início à conversa. Onde começa a tua?

Bem, eu nasci em Londres mas cresci algum tempo em Trinidad, onde o meu pai estava a trabalhar na altura. Acho que é desses tempos de Trinidad que vem a minha atitude tranquila em relação à vida. Sempre tive interesse em música e comprava muitos discos, muito por influência da minha irmã mais velha, fã de bandas como os Cult, Adam and the Ants, David Bowie, Eurythmics, os Simple Minds. Em Londres, os meus amigos deram-me a conhecer o mundo musical das rádios pirata e entrei a fundo no hiphop que girava em torno dos Public Enemy, dos Run DMC ou dos Trouble Funk.

Da busca pelos breaks e samples originais usados no hiphop, cheguei ao funk e ao jazz. E como a cena do rare groove era enorme nesta altura (estamos a meio dos anos 80), segui djs como Gilles Peterson e Pressure Drop, que me abriram os ouvidos para muita coisa diferente.

Sei que começaste como dj na faculdade, nas festas de estudantes, onde partilhavas a mesa de mistura com o Simon Lee e com o Andy Williams. Que festas eram essas?

Fazíamos uma festa de estudantes todas as terças feiras… Acho que se chamava “Wild and Sleazy” (nota. “Loucas e vulgares”), que nós abreviávamos muitas vezes, na brincadeira, para “Mild and Cheesy” (nota. “Calmas e foleiras”). Eu e o Simon e outro amigo, o Matt Anthony (meu parceiro nos lançamentos Optimus), éramos os residentes em cima, tocando os sons não-house, ou seja, um pouco de funk, de disco e de hiphop. As bebidas eram todas a uma libra por isso não me lembro bem de muito do que se passou lá! E o Andy tocava em baixo, com outros djs. Foi a única coisa que eu fiz na faculdade onde aprendi realmente algo que me fosse útil agora!

Aquelas festas na universidade devem ter sido qualquer coisa de extraordinário para fazer com que as três pessoas que nelas se encontravam atrás dos pratos tenham ganho uma paixão pela música tal que tenham feito dela vida. E que vida. Foi esse o caso de Simon Lee, ele que dá corpo aos Faze Action, e que esteve nas cabines do Luxfragil nesse mesmo mês. Foi esse o caso de Andy Williams, ele que esconde este nome quando se assume como Yam Who. Como foi o caso de Matt Anthony, que partilha com Pete, a Optimus. E aconteceu o mesmo com Pete Herbert.

O que te fez olhar para a música como algo mais do que uma mera paixão?

Acho que foi olhar para a música e perceber que podia fazer algo de que realmente gostasse e que o pudesse fazer em full time. Ver bons djs foi sempre uma inspiração mas olha que o mesmo pode ser dito de ver maus djs.

A loja de discos Atlas, de que tu eras responsável, é ainda olhada hoje com carinho, reconhecida que é a sua importância na cena de música independente inglesa. A tua percepção poderá ser diferente, afinal de contas, era a tua loja. O que é que, para ti, a tornava diferente das outras lojas?

Acho que tudo o que se diz em relação à Atlas tem a ver com o timing do aparecimento da loja. Tinha trabalhado em algumas lojas antes de criar a Atlas e tinha aprendido com os meus antigos patrões como não gerir uma loja de discos. Havia uma dificuldade enorme, em Londres, em conseguir discos que não fossem discos de house, garage ou hiphop/r’n’b. Se querias um disco de electrónica estranho ou se querias um 12 polegadas com edits de disco, não havia uma loja que os vendesse. E a Atlas preencheu esse vazio.

Houve outros pormenores que a tornavam diferente. Por exemplo, recusámo-nos a vender discos de majors. E tínhamos pontos de escuta, algo inédito nas lojas de discos de Londres. Tinha ido a Nova Iorque comprar discos e vi que as lojas lá tinham pontos de escuta e fiz o mesmo na Atlas. Apesar de ser no Soho, a localização fora de mão também acho que ajudou, no sentido de que, como era preciso saber onde era a loja, só lá ia parar quem estivesse genuinamente interessada naquilo que tínhamos para vender.

Tudo isso ajudou a que contássemos com gente como Gilles Peterson, Andrew Weatherall, Harvey, Norman Jay, Howie B, Bjork ou os Jazzanova como clientes habituais… gente que sei que gosta de boa música, que é o que eu acho que nós tínhamos na loja. Se ofereceres um bom serviço às pessoas, elas costumam voltar.

Lembras-te de alguns discos que tenham vendido muito na Atlas?

Bem, essa é difícil. Lembro-me que editoras como a Rhythm and Sound, a Basic Channel, a ECM, a Environ, a Playhouse, os Black Cocks e os discos do Moodymann vendiam sem parar.

E lembras-te de discos que vendeste na Atlas que gostavas de ter hoje?

Demasiados. Vendi tantos discos nos últimos 10 anos para fazer espaço para os novos… E tinha sempre a mesma justificação para os vender… “Se precisar deste disco outra vez, posso encontrar outro”. Mas já não sou tão fundamentalista em ter discos raros como era há uns anos atrás.

Foi na Atlas que conheceste o Phil Mison?

Não, conheci o Phil Mison noutra loja onde trabalhei antes de ter a Atlas. Acho que foi em 1993. Ele estava a tocar no Café Del Mar, em Ibiza, e tinhamos amigos em comum. Vendia-lhe discos na altura e ficámos amigos. E dessa amizade surgiu os Reverso 68…

Tínhamos planeado fazer música juntos mas nunca tinha acontecido. Nisto, um amigo nosso, o Robbie Insinna (Headman), convida-nos aos dois para fazer uma remistura e dissemos que sim. Foi assim que apareceram os Reverso 68.

...que quer dizer exactamente o quê, o nome?

É de um livro de puzzles de palavras, típico de férias, que o Phil andava a ler na praia. Precisávamos de um nome rápido! Ainda temos o puzzle e esperem que um dia vai ser capa de um qualquer lançamento de Reverso.

Também tens com o Phil Mison os Frontera. Soube que havia planos para álbum, certo?

Sim, há. Frontera é uma versão mais tranquila de Reverso 68 e estamos a escrever o álbum neste preciso momento. Queremos que o álbum flua do princípio ao fim, sem pausas nos temas, um CD que coloques e que deixes a tocar sem andar de um lado para o outro. Álbuns como os de The Reminiscent Drive e os de John Beltran da fase inicial são uma grande influência para este álbum.

E no presente imediato, o que é que há de novidades tuas?

Relativamente a Reverso 68, vamos relançar o nosso primeiro single “Piece Together” na Eskimo para o qual espero que o Todd Terje já tenha feito a remistura. E temos mais algumas remisturas que já estão feitas e que devem ser lançadas brevemente. Estou é muito satisfeito com uma remistura de Reverso 68 para Frontera (eu sei, remisturares-te a ti próprio… promoção desenvergonhada…) e com uma remistura dub, também dos Reverso 68, para um original do Badly Drawn Boy.

Portugal, com a quantidade de sol e praias óptimas que tem, é/deve ser poiso natural, como Ibiza, para o baleárico. Com o Phil Mison, que trabalha tão de perto contigo, como residente no Café Del Mar (actor principal na cena do crime) e tu próprio a seres considerado um dos grandes especialistas do género, não podia passar sem te pedir uma selecção de discos baleáricos.

Bem, aqui estão uns quantos que sempre me fazem sorrir quando estou deitado na praia com uma piña colada nas mãos:

Manuel Gottsching – E2E4
Move D – Beyond the machine
Mike Perras – Beginning of life
Tulio de Piscopo – Stop Bajon
Michael Shrieve – Transfer Blue Station
Nina Simone – Baltimore
Jean Luc Ponty – Ethereal Mood
Jago – I’m going to go
Gino Soccio – Closer
Keytronics Ensemble – Calypso House

Juntos, valem uma hora da vida de cada um de nós.

entrevista conduzida por José Belo e originalmente publicado na revista da programação do Luxfragil para o mês de Julho, por ocasião da vinda de Pete Herbert à discoteca de Sta. Apolónia.