<$BlogRSDUrl$>
.

HitdaBreakz

9/25/2007

Lisergia


A minha paixão pelo rock dos anos 60, à primeira vista, não faz grande sentido. Seguidor atento da música de dança, desde que me lembro de comprar discos, o rock era um outro lado que desconhecia e que raramente explorei. Na fase crítica onde muitos dos gostos são definidos, nunca me atraiu o género, nunca lhe segui o rasto, afastado que fui pelo facto de grande parte dos meus bons amigos de adolescência terem andado a consumir o por vezes manhoso hard rock e metal dos anos 80. Abri os braços à 4AD e a todo o movimento indie que aparecia em Inglaterra mas fiquei-me por aí. Sou tudo menos o típico fã de rock e não o digo com qualquer espécie de orgulho. A cada qual, o seu.

Hoje em dia, a minha imersão no mundo da música de dança é demasiado intensa para compreender quem são e de onde vêm as bandas que preenchem os festivais todos os anos. Só a mera preocupação em tentar seguir o zeitgeist me leva a descortinar quem são os Bravery ou como soam os Babyshambles quando são inspirados pela Kate Moss.

No entanto, a verdade é que o rock, e principalmente o rock psicadélico melódico, diz-me muito. E, confesso, era coisa que estava longe de pensar que dissesse. O facto de ser de épocas diferentes da minha podia, à primeira vista, denunciar isso mas a verdade é que sempre tive prazer em descobrir o que tocava antes na rádio. Estava longe de pensar porque quase nunca tive contacto com ele. Nos sítios onde cresci, o rock psicadélico era tudo menos plat du jour musical. Coisa que a música de dança não era. Coisa que os ambientes da 4AD ou o indie rock ou mesmo Madchester não eram. Eram géneros com que cresci, com quem cresci também. Mesmo com o funk, com a soul e com o jazz, outros pontos importantes no meu gosto musical, isso acontecia. Estavam à minha volta regularmente. O rock psicadélico era, isso sim, um verdadeiro desconhecido.

Depois de apresentados, este rock é o melhor contraponto que conheço para a intensidade da dança. não que a música não seja intensa mas por ser tão diferente daquilo que habitualmente oiço, o facto de apontar para direcções que habitualmente não sigo faz com que seja um enorme descanso, o tal contraponto, de que falava. Talvez mais até do que o jazz.

Mas será assim um contraponto tão grande? Afinal de contas, não será o psicadelismo dos anos 60 igualmente percursor da música de dança de hoje em dia? Com o funk e a disco a assumirem papel preponderante na história da música de dança, o rock psicadélico raramente é citado como influência do que hoje commumente chamamos de house e techno. Se o ritmo que o funk impunha nos fazia perder suor, o rock psicadélico impunha a sua força na mente. Vejo, por exemplo, pontos comuns entre o que os comunais Yahowa 13 andavam a fazer e a situação actual de gente como Ricardo Villalobos. Para lá do subjectivo que as comparações sempre têm, existe também comunhão evolutiva entre os dois aparentemente distantes géneros. David Mancuso, por exemplo, participando como actor, nas longas viagens proporcionadas por Timothy Leary, compreendeu nelas o poder social que a música tinha e nelas delineou as Loft parties que, anos depois, são marco fulcral na evolução da música de dança. E que dizer da coincidência de o termo "Summer of Love" ser usado por ambas, em tempos tão diferentes, para definir a mesma coisa : intensamente juntos na música.

Não que sejam estas as razões por gostar do rock geralmente conotado com a louca São Francisco dos anos 60. Por muito respeito que tenha pelo dj norte-americano e pelo dj chileno (respeito que estou certo que crescerá depois de ouvir a sua compilação para o Fabric), é ridículo pensar-se que podem influenciar, por si só, alguém a ouvir todo um género. São apenas pequenas e interessantes curiosidades que ajudam a fazer sentido de tudo isto.

Em baixo, está uma pequena lista pessoal de álbuns da época áurea dos anos 60. Pontualmente, existem álbuns de outros anos mas que, pela sua mensagem, fazem todo o sentido. Os álbuns dos anos 60 são tudo menos coerentes entre si. O que se percebe facilmente quando se vê nele a pop dos Mamas and Papas lado a lado com o quase puro psicadelismo dos Major Arcana. E, se o texto exprime uma paixão pelo rock psicadélico, há discos na lista que de rock têm muito pouco, como é o caso dos discos da Linda Perhacs ou dos Wali and the Afrocaravan, por exemplo. A verdade é que os Wali and the Afrocaravan até partilham a editora com o rock tingido de Hendrix do "Perpetuum Mobile" de Mariani, disco que esconde a provável estreia de Eric Johnson na guitarra, na altura com 14 anos. Nem que seja por aí (não é), existe algum nexo causal.

Leia-se a lista com o disclaimer de que não é o who's who on acid, lista que seria algo limitativa num mundo musical tão intenso e diverso. Não é tão desconexa como posso estar a dar a entender já que o tronco comum é a lisergia mas suficientemente ampla para abarcar várias e distantes ramificações. Que faça feliz quem encontrar nela um disco que o marque, como muitos deles me marcaram a mim.

Alguns dos discos já foram reeditados oficialmente mas muitos deles foram pirateados. A Radioactive, por exemplo, que é responsável pelas reedições que existem dos fabulosos Relatively Clean Rivers ou dos Fifty Foot Hose, é tudo menos edição oficial. Se por defeito de profissão, sou absolutamente contra a pirataria, neste tipo de discos, o racionalismo leva-me a pensar que pouquíssima gente conseguiria ouvir os Relatively Clean Rivers ou os Fifty Foot Hose se não fosse a Radioactive a reeditá-los em CD. Por isso, não sei que pense quando a reedição pirata é sobre algo tão tão raro, tão tão caro e tão tão bom como esses discos. Informados que estão, façam o que acharem melhor.

A Discolecção, em Lisboa, ou a Melocoton Records, em Madrid, ou o eBay são os principais locais onde encontrar estes discos. Infelizmente, como no funk, Portugal nos anos 60 e 70 não estava muito para aqui virado musicalmente e, por isso, são raros os discos que se podem encontrar a fazer diggin'. Não quer dizer que não acontece (acontece) mas é mais fácil o Scolari acertar um murro.

AORTA Aorta (Columbia, 1969)
ANONYMOUS Inside the shadow (A Major Label, 1976)
AZITIS Help (Elco, 1971)
BEACON STREET UNION The eyes of the Beacon St. Union (MGM, 1968)
BIG BROTHER AND THE HOLDING Cheap Thrills (Columbia, 1968)
TERRY BROOKS AND STRANGE Translucent World (Outer Galaxies, 1973)
THE CEYLEIB PEOPLE Tanyet (Vault, 1968)
THE CHAMBER BROTHERS Time has come (Columbia, 1967)
THE CHOCOLATE WATCHBAND The inner mystique (Tower, 1968)
THE CROME SYRCUS Love Cycle (Command, 1968)
CYNARA Cynara (Capitol, 1970)
THE DEEP Psychedelic moods of the deep (Cameo Parkway, 1966)
THE ELECTRIC PRUNES Mass in F Minor (Reprise, 1967)
EUPHORIA A gift from euphoria (Capitol, 1969)
THE EXKURSIONS The Exkursions (prensagem privada, 1971)
CYRUS FARYAR Cyrus (Elektra, 1971)
FIFTY FOOT HOSE Cauldron (Limelight, 1969)
FRACTION Moon Blood (Angelus, 1971)
FRIENDSOUND Joyride (RCA Victor, 1969)
THE FREDRIC Phases and faces (Forte, 1968)
FREAK SCENE Psychedelic Psoul (Columbia, 1967)
GANDALF Gandalf (Capitol, 1968)
MORT GARSON The Wozard of Iz (A&M, 1970)
GRODECK WHIPPERJENNY Grodeck Whipperjenny (People, 1970)
THE GROWING CONCERN The Growing Concern (Mainstream, 1968)
THE IDES OF MARCH Vehicle (Warner Bros., 1970)
INNER DIALOGUE Inner Dialogue (Ranwood, 1969)
JOSEFUS Josefus (Mainstream, 1970)
JOSEPH Stoned Aged Man (Scepter, 1970)
KALEIDOSCOPE Side Trips (Epic, 1967)
MAYTREIA KALI Inca (United Kingdom of America)
PERRY LEOPOLD Experiments in metaphysic (prensagem privada, 1970)
THE LISTENING Listening (Vanguard, 1968)
LOTHAR AND THE HAND PEOPLE Presenting Lothar and… (Capitol, 1968)
MAJOR ARCANA Major Arcana (A Major Label, 1976)
THE MAMAS AND PAPAS If you can believe your eyes and ears (Dunhill, 1966)
MARCUS From the house of trax (prensagem privada, 1979)
MARIANI Perpetuum Mobilee (Sonobeat, 1970s)
MECKI MARK MEN Mecki Mark Men (Limelight, 1968)
THE MUSIC EMPORIUM Music Emporium (Sentinel, 1969)
THE MYSTIC NUMBER NATIONAL BANK Mystic Number National Bank (Probe, 1969)
THE MYSTIC SIVA Mystic Siva (V.O, 1972)
NEIGHB'RHOOD CHILDR'N Neighb’rhood Childr’n (Acta, 1968)
THE NEXT MORNING The Next Morning (Calla, 1971)
DENNIS OLIVIERI Come to the party (VMC, 1969)
PATRON SAINTS Fohob Bohob (prensagem privada, 1969)
THE PEANUT BUTTER CONSPIRACY …is spreading (Columbia, 1967)
THE RED KRAYOLA Parable of Arable Land (International Artists, 1967)
RELATIVELY CLEAN RIVERS Relatively Clean Rivers (Pacific Is, 1976)
LINDA PERHACS Parallelograms (Kapp, 1970)
US69 Yesterday’s Folk (Buddah, 1969)
WALI AND THE AFROCARAVAN Home : Lost and found (Sonobeat, 1969)
THE WALNUT BAND Go nuts (Apaloosa, 1976)
WEST COAST POP ART EXPERIMENTAL BAND Part One (Reprise, 1967)
YAHOWA 13 Kohoutek (Higher Key, 1973)