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HitdaBreakz

5/21/2007

Seja bemvinda, Sra. D. House




Tem-se assistido, por todo o lado, ao regresso, pé ante pé, da house. Dada como morta na sua fase menos fulgurante, soube perceber que não é só de samples de discosound e de vozes de diva que o mundo é feito.

E, compreendendo todo o furor electrónico que assolou o planeta neste início de milénio, parte firme para tentar ocupar o trono agora vago pelo cada vez mais desinteressante techno.

Não há dúvida, para quem quer que tenha estado numa pista de dança nos últimos anos, que não tem sido a house o seu motor principal. A predominância dos sons electrónicos do eixo teutónico tem sabido, até há relativamente pouco tempo, equilibrar quer a novidade quer a satisfação do público à sua frente. No entanto, disco após disco, a saturação, por parte do público, que se sente no techno de hoje é palpável. O que não podia deixar de acontecer, diga-se. E não podia deixar de acontecer porque houve uma saturação sónica em relação aos ultimamente imutáveis sons do techno de tendência minimal. Por outro lado, está a existir um excesso de oferta e grande parte dela sem grandes padrões de qualidade sustentada. É que desde consagrados noutras paragens a novos miúdos no bloco que nunca tinham editado um disco, a pujança evidente do género cativou, e bem, um sem número de produtores para o seu lado. No entanto, como em tudo o que é em excesso, rapidamente se esgotaram novas ideias e chegou ao actual ponto de desesperante fórmula repetitiva. Fórmula essa que enferma grande parte dos discos mais ligados ao puro tech que hoje vêem a luz do dia e que pouco ou nada acrescentam ao que fora feito ainda ontem.

Sedentos pela novidade, as pistas ressentem-se e o espaço agora deixado vago tem sabido ser aproveitado por sons diferentes, próximos do house. Fenómeno que as próprias entidades editoriais têm sabido reconhecer, notando-se, em vários planos, reajustes das sonoridades de editoras como a Get Physical, a Poker Flat ou a Kompakt, para este novo paradigma que surge agora associado à house. Nota-se uma enorme preocupação em todas elas de fugir ao formato tool para abraçar, de corpo e alma, o formato canção. E nota-se, igualmente, que as novas e fortes contratações de Inverno têm sido, em grande parte, gente do mundo da house: como é Jesse Rose ou Radio Slave, por exemplo, para a Get Physical; como tem sido indicador a maneira positiva como são recebidas as novas edições de Martin Landsky ou Nick Holder na Poker Flat. E não dá para pensar outra coisa senão na tomada de consciência de que provavelmente a validade estará também noutros lados, quando olhamos para as mais recentes edições da teutónica uber alles Kompakt. Com Partial Arts (Ewan Pearson e Al Usher, dois nomes fortes do house inglês) e com a remistura de Prins Thomas para Justus Kohncke no pelotão da frente, qualquer um deles bem distantes dos sons herméticos que caracterizam o gigante de Colónia. E todos eles house na sua essência. Mudança essa que se aplaude na editora alemã e que é, sem dúvida nenhuma, um sinal forte de que a sua receita habitual já viu melhores dias.

Por falar em Prins Thomas, e pensando no Prins Thomas dos discos, o discosound e a aceitação generalizada da emoção que sempre existiu no discosound foram igualmente importantes para a reestruturação da house. E, porque não, para servir de antecâmara de ouvidos habituados a outras sonoridades. Com matriz genética da soul e do funk, o discosound soube sempre canalizar, nos seus temas, a emotividade que lhe é própria. Coisa que a house, seu descendente directo, foi mestra em perceber e que o mais recente techno tem sido incapaz de retribuir.

Até aqui, pode parecer que a house está a ressurgir porque outros estão em queda. Não é totalmente mentira. E até poderiamos usar os habituais ciclos na música para ajudar a explicar isso. Mas não é só por isso. E não é só por isso porque se tem assistido a uma fortíssima movimentação atrás das cenas para que seja por mérito próprio que a house está hoje sustentadamente a criar condições para assumir novamente o palco principal.

Movimentações que passam por coisas simples e subjectivas como reacções na pista a discos de house, por inflexões em sets de djs de vários quadrantes mas também por coisas objectivas como a quantidade de discos de house clássico que andam a sair e o ressurgimento de carreiras e direcções musicais há muito adormecidas e que vêem agora o seu espaço reconquistado. Para isso, muito contribuiram editoras europeias que conseguiram sintetizar o house com a vertente mais electrónica, editoras como a Innervisions, a Moon Harbour, a Members of the Trick, a Styrax, a Mojuba ou, a espaços, a Cadenza e todo o circuito holandês entre a Rush Hour, a Delsin e a Intacto têm permitido ao Velho Continente a sua posição contributiva. Posição essa reforçada, disco a disco, por nomes como Dixon, Franck Roger, Ame, Trickski ou Skwerl. No entanto, é nos Estados Unidos que residem os grandes impulsionadores. Se o “novo” sangue é de Jus-Ed, de Omar S, de Mr. V ou de Dennis Ferrer, nomes que estão a contribuir para a nova colheita, a verdade é que o velho sangue continua bem e recomenda-se. Que o digam Rick Wade, Theo Parrish, Kerri Chandler ou Ron Trent, todos eles responsáveis por edições recentes capazes por si só de retirar todos os pregos que já haviam pregado no caixão da house. A house, graças a eles e a muitos outros, está vestida de novo e pronta para o baile.

Texto publicado originalmente na revista Dance Club