<$BlogRSDUrl$>
.

HitdaBreakz

4/03/2007

Jazz Bridges # 3: The Fender Rhodes


Harold B. Rhodes, um pedagogo californiano especializado no ensino do piano, respondeu aos apelos da nação e, durante a Segunda Guerra Mundial, ingressou no Army Air Corps para fazer a única coisa que sabia fazer bem: tocar e ensinar música. Obrigado a constantes viagens entre bases, Harold depressa descobriu que o piano implicava uma logística complicada e decidiu pôr à prova algumas ideias que tinha tido e usar tubagem de alumínio de um bombardeiro B-17 para construir um piano mais leve e portátil. Com o final da guerra, Rhodes decidiu prosseguir as suas experiências e, já na década de 50, aliou-se ao gigante fabricante de guitarras Leo Fender para desenvolver o seu projecto. O primeiro modelo fabricado em conjunto levou o nome de Piano Bass por reproduzir as 32 notas de registo mais baixo do piano.

Em 1965, a CBS comprou o negócio a Leo Fender e permitiu finalmente que Harold Rhodes avançasse com a produção de um modelo de 73 teclas que está na base do clássico de 88 teclas que em 1970 começou a ser comercializado e que haveria de mudar o mundo.
A electricidade, obviamente, já era um dos componentes da equação do som de Sun Ra desde a década de 50, mas a primeira utilização notória de um piano eléctrico num disco de jazz de alargada circulação aconteceu em 1967 quando Joe Zawinul tocou um modelo Wurlitzer (concorrente da Rhodes) na sessão de “Mercy, Mercy, Mercy” de Cannonball Adderley. Miles ficou rendido e não tardou a introduzir um Wurlitzer no estúdio para Herbie Hancock usar nas sessões de “Water on The Pond” do mesmo ano. Quando em 1968 Miles entrou em estúdio para gravar “In a Silent Way” havia electricidade nos pianos de Herbie, Joe Zawinul e Chick Corea. A revolução vinha a caminho!
Em 1970, Harold B. Rhodes escrevia na contracapa de um disco: “A realização última para uma vida de esforço investido no desenvolvimento de um novo instrumento musical está no arrepio sentido quando se escuta a sua resposta ao preciso e sensível toque de um artista como Bill Evans.” Estas notas foram usadas na capa de “From Left to Right” de Bill Evans, um dos discos menos celebrados do pianista, mas ainda assim um álbum que anunciava uma tendência que haveria de permitir ao jazz abrir-se para outras sonoridades e paisagens. Uma das buscas incessantes do jazz aconteceu desde sempre nos domínios do som puro. E o Rhodes ofereceu a possibilidade de se trabalhar com um registo novo, fascinante porque inexplorado. O som de cristal deste piano e as possibilidades de modulação abertas pela amplificação – muitos pianistas adoravam captar o som do Rhodes através de uma coluna Leslie, que tinha a particularidade de possuir altifalantes rotativos – ou pela adição de novos artefactos como a caixa de delays Echoplex permitiam “personalizar” o som e torná-lo a extensão de uma ideia ou de uma personalidade. Não demorou muito para o piano eléctrico Fender Rhodes se assumir como o instrumento da década de 70, rapidamente ultrapassando as margens do jazz para se impor nos domínios do rock e da soul. De Chick Corea no seu projecto Return to Forever a Sun Ra no clássico “Languidity”, o som do Rhodes parecia envolver o jazz com o seu manto líquido de cristal que evocava na perfeição novos mundos e atmosferas oníricas. Lonnie Liston Smith, por exemplo, fez uma carreira da exploração deste som. Em 1971, como parte do alargado ensemble dirigido por Pharoah Sanders no álbum “Thembi”, Lonnie Liston Smith vincou a sua capacidade com esse instrumento e não voltou a olhar para trás, editando uma série de clássicos do chamado “jazz-funk” durante o resto da década. Álbuns como “Astral Travelling” ou “Expansions” são autênticos tributos às possibilidades tímbricas e harmónicas oferecidas pelo Rhodes.
Outra das celebradas relações com o Rhodes foi iniciada por Herbie Hancock por alturas de “Mwandishi” e prosseguiu em clássicos deste fase eléctrica do jazz como “Crossings” ou “Sextant”. Miles, claro, também garantiu lugar cativo ao Rhodes nos palcos em que incendiou a sua visão do jazz, transportando-o para outras galáxias. “Bitches Brew” é um dos clássicos desta época que não dispensou o interface galáctico em que o Rhodes se tinha tornado.
Harold B. Rhodes faleceu em Dezembro de 2000 com 89 anos. A sua criação continua a marcar com distinção vários campos da música, incluindo o novo jazz de projectos como os MI3 (Clean Feed, 2005).