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HitdaBreakz

4/10/2007

Dubstep


O ano que ainda agora findou teve muito que mostrar em termos musicais. Foi o ano da afirmação do tech minimal como rei das pistas de dança, afirmando novas estrelas no firmamento como Ricardo Villalobos. Mas teve também o dom de fazer com que um pequeno género musical que andava a borbulhar pelo Reino Unido, finalmente, as luzes da ribalta e colocasse o seu nome nas bocas de toda a gente – o dubstep. Nascido das cinzas formulaicas do UK garage e com uma matriz genética que vai do dub e do reggae jamaicano ao drum’n’bass mas que também se alimenta tanto do old school hardcore que movimentavam as pistas no início dos anos 90 como do já referido UK garage. E é na interpretação muito sui generis desta amálgama de referências, verdadeiro melting pot de géneros, que o dubstep se distingue e ganha, por si só, direito a uma prateleira nas lojas como género distinto de todos os outros. “Acho o dubstep fresco, a mistura de elementos que fazem é fresca e completamente anárquica”, comenta Mike Stellar, um dos principais divulgadores do dubstep em Portugal.

Como tantas outras histórias de géneros musicais, a história do dubstep tem o seu início oficial num subúrbio inglês chamado Croydon, onde uma pequena e já extinta loja de discos chamada “Big Apple” congregava nomes importantes como Hatcha, que é parte da loja, El-B ou Skream. Dois elementos são fulcrais para o lançamento do dubstep : a editora que entretanto surge associada à loja começa a editar os temas do talento que ali converge; e as noites Forward, com o seu fabuloso sistema de som, aceitando sem problemas os subgraves de que o dubstep tanto gosta.

E se há coisa que une todos os elementos do dubstep é o grave, um grave físico que nos atinge no peito mais do que nas orelhas. Para Kode 9, “tudo o resto [no dubstep] é colocado por cima desse baixo”. Outro elemento que ajuda a caracterizar boa parte do dubstep actual é o facto de estar em half-step, ou seja, a meio tempo. Enganosamente lento já que, escondido por detrás do meio-tempo, é suficientemente rápido para nunca deixar de ser o que toda a sua génese o faz ser : música de dança. Para Mike Stellar, “o dubstep trabalha uma velocidade que não é habitual ser trabalhada na música de dança, ali entre os 135 e os 140 bpms”. Para além disso, é eminentemente instrumental. Como lembra Martin Clark, o principal curador à volta do género, ele que responde também pelo nome artístico de Blackdown, o dub em dubstep alude não só às influências do dub-reggae mas também ao dub, ao instrumental. E é também por aqui que, se fosse possível tal coisa, a confusão com o grime termina, dada a sua propensão vocal e a sua mais próxima ligação ao hiphop. Confusão que a compilação “Grime vol. 2” na Rephlex, com nomes que são hoje preponderantes na cena como Loefah, Kode 9 e Digital Mystikz, não ajudou a quem só apanhou o comboio depois.

Com 2006, parece que as pessoas finalmente entenderam o que esta gente andava a fazer e o dubstep sai do seu palco habitual nas noites Forward e os seus actores começam a ter aceitação noutras cidades de Inglaterra, pegando nos seus discos e indo lá tocar para um público cada vez mais em sintonia com os graves. Novos locais para expor a música aparecem. A edição dos álbuns de Skream e de Burial, principalmente, legitimam o dubstep como só o formato álbum consegue fazer e, no caminho, deixa duas das principais referências para o dia de amanhã do dubstep. Mary Ann Hobbes, veterana dj da BBC Radio One, a apadrinhar o dubstep e a usar o meio que tem à sua disposição para o expor de uma forma que só uma rádio como a BBC consegue. E não é inocente a referência a Villalobos no início do artigo já que ele próprio reconhece o valor que existe no dubstep e, como no recente aniversário do Fabric, toca temas de dubstep no meio dos seus sets bem mais ligados ao techno. Os novos miúdos no bloco correm o globo, o dubstep é ouvido e falado em todo o lado. De Tóquio a S. Paulo. De Nova Iorque a Lisboa.

Em Portugal, o movimento começa a ganhar as suas primeiras referências agora. As primeiras noites de dubstep surgem em 2006 pela mão da Journeys e da Conspira e a vinda de artistas como Kode 9 e Spaceape ou Geiom deu ao público português o primeiro vislumbre daquilo que, anos antes, seriam as noites Forward. E as produções nacionais começam também, timidamente, a surgir. O que só manifesta a força de um género : quando é forte e estável o suficiente para ser sujeito à reinterpretação por parte de gente tão distante fisicamente da sua génese. E, sem dúvida nenhuma, o dubstep, neste momento é isso mesmo. E é exactamente essa a expectativa em relação aos próximos capítulos do dubstep – que influência terá toda esta expansão do género pelo mundo inteiro terá? A verdade é que o futuro, apesar da música nem sempre o denotar, é solarengo.

Texto originalmente publicado na edição de Fevereiro da revista "Dance Club"