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HitdaBreakz

3/26/2007

LCD Soundsystem: Sound of Silver


James Murphy é um homem com um plano. No fórum dedicado aos LCD Soundsystem na página da DFA, James lançou um repto muito peculiar aos seus fãs: “A banda sonora ‘Dreamgirls’ foi esta semana número 1 nos Estados Unidos de acordo com a Billboard com vendas de 60064. O primeiro álbum dos LCD vendeu nos Estados Unidos um total de 60559 cópias desde que foi editado. Isto significa, claramente, que se toda a gente que adquiriu o primeiro álbum comprar o novo ‘Sound of Silver’ na semana de edição nós seremos totalmente os primeiros!” Mais adiante, James afirma mesmo: “isto é um sonho e se acontecer poderei voltar à minha antiga profissão de carteiro porque a partir daí será mesmo sempre a descer.” Brincadeira ou não, a verdade é que James parece ter mobilizado a sua comunidade de fãs que é cada vez maior e que parece beber das suas palavras como se fossem as escrituras: “Os LCD querem encontrar uma forma de comunicar e tocar alguém com algum tipo de imediatismo, mas, ao mesmo tempo, evitando ser uma dessas bandas pop punk estúpidas,” explicou James recentemente. O objectivo, ao que parece, anda a ser cumprido.
Os LCD Soundsystem de James e Tim Goldsworthy estrearam-se nos álbuns em 2005 quando já levavam 3 anos de criação de hinos para as pistas de dança mais alternativas na forma de desafiantes singles. O tempo provou que a sua mistura de rock e abandono rítmico tinha total razão de ser quando um milhão de bandas com as mesmas ideias invadiu as páginas da imprensa internacional. “Sound of Silver”, o novo álbum, é no entanto algo diferente. Continua a ter as suas doses de rock e dança, mas as proporções e até alguns dos ingredientes foram alterados: há mais disco, por exemplo, mais fascínio pelo ritmo puro, se tal é possível. Numa das entrevistas já publicadas sobre o novo álbum, James afirmou que queria que alguém de 23 anos aparecesse e lhe desse “uma carga de porrada”. Mais do que um qualquer desejo masoquista mal disfarçado, o que James Murphy está a tentar dizer é que sente que os LCD Soundsystem estão mais ou menos sozinhos no lugar que reclamaram para si no panorama musical actual. Não há bandas novas, afirma James, com o tipo de… hum… “tomates” que os LCD Soundsystem exibem – excepto talvez os Klaxons, uma vez mais de acordo com James, que, apesar de tudo, reserva uma opinião mais definitiva para depois de os ver em cima de um palco onde espera que eles não se limitem “a parecer cool”.
Uma canção como “North American Scum” parece dar-lhe razão. Comentário político sobre o que significa ser americano nos dias que correm, “North American Scum” ainda assim não escusa a dualidade: James Murphy, com ascendentes irlandeses, afirma adorar a constituição americana e a história do seu país o que não significa, pois claro, que não possa fazer uma canção onde afirma “we’re the villains of old”. Consciente do que significa ser americano no mundo de hoje e do impacto que uma canção como esta pode alcançar, James confessou mesmo que muito provavelmente vai recusar-se a responder a perguntas específicas sobre “North American Scum”. Seja como for, sonhar com o número 1 nos Estados Unidos e apontar como primeiro single para empurrar as vendas do álbum um tema como “North American Scum” é mesmo de alguém com coragem, ou “tomates”, como já se tinha sugerido.
O que James já explicou é o significado do título do novo álbum. Segundo o homem forte dos LCD Soundsystem, o primeiro álbum era muito “beige” ou “castanho” e este é mais brilhante (talvez por causa do tal reforço da dose de disco sound). Mas também é uma referência pessoal de James ao que o seu pai passava a vida a falar-lhe sobre o que significa ter um filho – “passamos a estar sempre em segundo lugar”. E ao que parece “Sound of Silver” só foi escolhido para título porque James Murphy resistiu à tentação de lhe chamar “Oh Vanity Thy Name is Sophomore Effort”… Seja qual for o significado do título, é inescapável que o significado musical é profundo e que os LCD Soundsystem se preparam para ver a sua música subir ainda mais alto. E não, isso não acontece por causa da associação da DFA a uma major – afinal de contas quantas bandas em majors falam com os seus fãs regularmente através de um fórum de Internet? –, mas porque a música em “Sound of Silver” soa urgente e calculada, moderna e intemporal, vibrante e necessária. “A minha cena é muito pequena. Chama-se DFA é em Nova Iorque e é a minha vida, os meus amigos, a minha gente.” Verdade.



They love New York

LCD
SOUNDSYSTEM – Sound of Silver DFA/EMI-VC (2007)
*****

Depois do namoro com o gigante Nike em “45:33”, um tema pensado para acompanhar “joggers” durante três quartos de hora e distribuído através do iTunes, “Sound of Silver”, o segundo álbum dos LCD Soundsystem, apresenta-se em toda a sua glória ao mundo. Com a edição de “LCD Soundsystem”, em 2005, James Murphy e Tim Goldsworthy sintetizaram todas as mudanças de eixo de inspiração que a nação indie já vinha a ensaiar há algum tempo. Nova Iorque era, realmente, “the place to be” e a mistura daquilo a que correctamente chamaram “record collector rock” (Can, Talking Heads, Liquid Liquid…) com o grave pulsar da música feita para dançar resultou numa vibrante cena que, no entanto, raramente se estendia convincentemente para lá dos formatos funcionais para djs, os maxis. “Sound of Silver” pode, por isso mesmo, ser o primeiro magnum opus desta geração específica.No último tema deste álbum, “New York I Love You, But You’re Bringing Me Down”, James canta “New York you’re perfect, please don’t change a thing” e “New York I love you, but you’re freaking me out” num tom que se encaixa perfeitamente na “tradição” iniciada por Lou Reed em “Perfect Day” e que os Beastie Boys prosseguiram com “To the 5 Buroughs” – declarações de amor a uma cidade que é tão imaginada como real. James implora “take me off your mailing list/for kids that think it still exists” com pleno sentido de humor, mas igualmente de forma sentida. Mais do que uma carta de amor, esta canção – e este álbum, no fundo – é uma carta de desencanto, com a dose certa de dualidade de sentimentos, abandono e política. Em “North American Scum” James Murphy afirma ironicamente “for those of you who still think we’re from England/we’re not, no” e de alguma forma somos atirados directamente para as entranhas do CCB em 77 ou 78. Esse é o ponto forte de “Sound of Silver”: a forma como se evoca o espírito de uma certa Nova Iorque
combativa da era punk, pois claro, mas ao mesmo tempo se investe fundo num puro
hedonismo dançante. Equilíbrio perfeito. Talvez o pormenor que faltava em “LCD
Soundsystem” e que agora é esculpido ao pormenor, com ritmos sintetizados,
cowbells, baterias reais, camadas de verniz analógico dos sintetizadores e
faíscas de guitarras. “Sound of Silver” tem alma e estilo, tem conteúdo e forma,
tem ideias e grooves. Tem rock. E tem Disco.


(ambos os textos foram publicados na edição # 9 da revista Blitz)