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HitdaBreakz

3/10/2007

Jay-Z: no reino dos seus


Será que alguém consegue afirmar que realmente acreditou que “Black Album” era o ponto final na carreira de “Jay-Z”? Duvidoso… Jigga é demasiado Hip Hop para se contentar com uma participação lateral no jogo assumindo apenas uma das suas partes: afinal de contas, administrar a Def Jam é apenas uma extensão da sua reconhecida faceta de hustler. Numa coisa, no entanto, é possível ceder – talvez Jay-Z não tenha regressado por vontade própria, talvez o chamamento do próprio Hip Hop fosse demasiado dramático para ignorar. Ou talvez tenha sido a perspectiva de ver Nas – agora na Def Jam – a ocupar definitivamente o seu trono que tenha sido mais forte e convencido Hova a voltar a cuspir rimas em frente a um microfone. Talvez não seja nada disso ou talvez seja tudo isso, mas “Kingdom Come” aí está. Grande plano na capa, para se poder olhar directamente para dentro dos olhos de Jigga e acreditar nas palavras, nas atitudes e na música que agora nos oferece. Mas…
…O primeiro problema de “Kingdom Come”, porém, é o próprio Jay-Z. Em primeiro lugar porque há que comparar este disco a “Black Album”, a “Blueprint” e a “Reasonable Doubt”: e se perde de “knock out” com “Reasonable Doubt” é pelo menos derrotado aos pontos nos outros dois casos, mesmo que momentaneamente nos surpreenda com algum “uppercut” (como “Do You Wanna Ride” ou “Beach Chair”) e ganhe um par de “rounds”. Jigga manteve o seu arsenal de flows bem polido e continua em forma, mas não se sente fome na sua voz, nem urgência. As rimas chegam mesmo a ser pobres, tanto em argumentos como em construção - “you hot like fire/as I blow this dough/you might retire/Take it slow/like Neo/when shots was fired/in the matrix” – e Jigga parece demorar-se mais em interjeições do que no passado. E isso é tudo compreensível: afinal de contas, todos os álbuns anteriores de Jay-Z (incluindo os que fez com R Kelly e exceptuando apenas o erro que foi o disco com os Linkin Park) resultaram de um desejo óbvio de conquistar o mundo, de crescer, de ascender não apenas artisticamente, mas sobretudo como ícone de uma cultura agressiva que hoje domina o planeta. E agora, Jigga está no topo do mundo, vende computadores para a HP, passeia-se com Beyonce, passa férias com as maiores estrelas de Hollywood, assiste na primeira fila às mais importantes passagens de modelos, controla uma das equipas da NBA e é suficientemente importante para boicotar a Crystal e causar efeito! Fome? Tentem antes fartura. Nestes casos é difícil voltar a surpreender e é o que acontece: “Kingdom Come” é Jay-Z a meio gás… o que até pode ser ainda melhor do que muitos bons MCs a 200 por cento, mas não é Jay-Z clássico, nem sequer ao nível dos beats que, com um par de excepções soam a ideias requentadas, a começar no single “Show me what you got” que não apresenta um Just Blaze em topo de forma. Longe disso até. Kanye, por outro lado, faz de “Do You wanna Ride” com John Legend um dos melhores momentos do álbum, mas é impossível não pensar que o tema já estava escrito quando foi apresentado a Jay-Z. É que o seu encaixe ali não é dos mais felizes. Tema sentido, em que a voz de Jigga chega mesmo a carregar algum arrependimento, é “Minority Report”, obviamente influenciado pela devastação causada pelo Katrina em New Orleans: Jay diz que deu um milhão, mas não ofereceu o seu tempo, e que por isso é como se não tivesse dado nada… Alie-se isto à abordagem do assunto da idade em “30 Something” e o estranho momento que é “Beach Chair” com Chris Martin dos Coldplay, e Jigga, que sempre se apresentou maior do que a vida mesmo quando estava a começar, parece humano. E frágil. E isso é bom. No reino dos seus pares, Jigga continua a ser uma figura de respeito. Mas o Hip Hop está a mudar e este álbum é a prova!
PS: texto publicado originalmente na revista Dance Club.