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HitdaBreakz

11/30/2005

William DeVaughn - Be Thankful For What You Got


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Quem não se lembra da obra prima Blue Lines dos Massive Attack? Foi, claro, com esse álbum de 1991 que pela primeira vez travei conhecimento com o tema Be Thankful for What You Got, um original de um obscuro - à época, claro - William DeVaughn que ainda demoraria mais alguns anos a descobrir. Em 1998 os portugueses Cool Hipnoise fizeram uma versão do tema (incluída no álbum Missão Groove), depois de, anos antes, o terem começado a incluir no seu reportório de palco. Obter o original de William DeVaughn tornou-se, em si mesmo, uma missão de obtenção do groove.

Em 1999, numa das minhas regulares incursões à feira de Paço de Arcos, com um amigo, a sorte acabou por me bater à porta, mas não de forma imediata. Quando se digga com um amigo, o azar pode ser tramado. Senão imagine-se a cena: passeia-se pela feira, vêem-se umas caixas com discos num canto, baixamo-nos para sujarmos os dedos e há que escolher: esta caixa para mim, aquela para ti. Ora, é impossível concentrarmo-nos, pois nunca se sabe se a sorte vai bafejar quem está ao lado e não a nossa própria caixa. Foi esse o caso: de repente, vejo o meu amigo a passar pelo tão desejado disco de William DeVaughn. Era Verão, lembro-me nitidamente, porque apesar do sol estar forte naquele momento pareceu tornar-se ainda mais brilhante só por causa do vislumbre da capa de um clássico. Eu nunca tinha visto o original e aquela capa parecia bradar "ANOS 80" com todas as suas forças, mas isso também não me desmotivou. Educada e nervosamente deixei o meu amigo chegar ao fim da caixa e levantar-se. E passei eu para aquela caixa. Tão descontraídamente como fui capaz fui seguindo pelos discos fora até chegar ao disco de William DeVaughn. A minha interpretação depois foi digna de um óscar: "Olha este disco. Vou levar, acho eu... Quer dizer, depende do preço. Quanto é? Duzentos escudos?... Não sei... Olhe, está bem...!"

Só quando cheguei a casa é que percebi que tinha uma edição original na mão: prensagem americana de 1974 na Roxbury Records do único álbum editado nos anos 70 por DeVaughn. YEEEES! E que disco. Produzido e orquestrado por John Davis (esse mesmo, o da Monster Orchestra), tocado pelos MFSB de Vince Montana, este é um álbum de pura classe, muito inspirado pelo grande Curtis Mayfield, mas com todos os temas escritos pelo próprio William DeVaughn. Os arranjos são fenomenais: puro sunshine soul, perfeito para preguiçosas tardes de Verão. E aquele tema. Aquele tema, meu deus! Groove perfeito, voz perfeita, melodia perfeita. Tudo perfeito. Os ingredientes que fazem um clássico estão todos lá, espraiados com mestria ao longo de mais de sete minutos de emoção feita música. E a história do disco é igualmente curiosa: DeVaughn era um anónimo funcionário público que uma tarde decidiu entrar no mítico Omega Sound, um estúdio de Filadélfia, para, com 900 dólares gravar um disco. A sessão foi tão produtiva que o dono do estúdio decidiu ajudar a encontrar uma editora para o álbum, coisa que acabou por acontecer quando a Roxbury concordou editar o disco. Resultado: dois milhões de cópias vendidas e pelo menos dois singles desse álbum no Top 5 - Be Thankful, claro, e Blood is Thicker Than Water. Mas DeVaughn era um homem religioso - testemunha de jeová - muito mais interessado em espalhar a sua fé do que em ser uma estrela da música e por isso rapidamente abandonou a carreira que tinha arrancado de forma tão retumbante, voltando ao seu emprego. Só em 1980 é que voltou a editar - Figures Can't Calculate é o título - outro belíssimo disco, que, no entanto, e apesar do sucesso de novo obtido (chegou ao Top 40) - não chegou à marca de brilhantismo da sua estreia. Incrível, não?

Por isso mesmo, fiquem atentos: numa caixa cheia de discos empoeirados perto de vocês, pode muito bem andar outra cópia deste disco. Venderam-se dois milhões de exemplares: pelo menos uma boa meia-dúzia há-de ter chegado cá, não?

William DeVaughn - Be Thankful For What You Got (edit) (MP3)