<$BlogRSDUrl$>
.

HitdaBreakz

3/08/2005

SEJA FUNK A VOSSA VONTADE (PARTE I DE II)


Image hosted by Photobucket.com

Acabei agora mesmo de ver o In tune and on time do DJ Shadow e fiquei com a enorme sensação de que aquele é o dj set ou concerto do futuro. A imagem de um homem só, em cima de um palco (com laptop ou não, como foi o caso), a produzir som como se lá estivesse uma orquestra, é algo que só os nossos olhos e ouvidos do século XXI podiam aspirar a ver. Vivemos tempos em que a electrónica e todas as suas componentes ganham cada vez maior espaço quer nos nossos media quer nos nossos ouvidos. Não me parece também nada despropositado salientar que o hiphop aceita sonoridades electrónicas, dançantes ou não, no seu universo, desde que o hiphop é hiphop.

Que o hiphop teria que seguir a via electrónica desde esses tempos primordiais não pode ser surpresa para ninguém que estivesse a par da música que se fazia até essa altura. Porque Miles Davis nos disse que "a electrónica e o funk são amigos" no On the Corner. Porque era eléctrico o som de Sly Stone. Porque era num mundo de ficção científica que habitava George Clinton e o seu parlamento. Mas estas referências são lineares, quase esperadas num género habituado a ir sugar ao passado as suas respostas. O golpe de asa para esta associação entre o funk e a electrónica foi Afrika Bambaataa que o deu.

Image hosted by Photobucket.com

É preciso alguém com um sentido rítmico fora do comum, como Bambaataa tem, para compreender funk no meio do Trans Europe Express dos Kraftwerk. Com o sucesso inesperado em pista dos Kraftwerk, não demorou muito até que os produtores entendessem a sede electrónica que as pessoas tinham. E logo apareceram discos do Bronx a tentar recriar/aculturar os sons dos alemães. Bambaataa deu o mote com Planet Rock, um tema produzido por um tal de Arthur Baker e, com ela, deu início ao electrofunk. A este, seguiu-se Looking for the perfect beat e Renegades of funk, discos onde a dupla Bambaataa/Baker fixaram os mínimos olímpicos para todos os outros produtores.

Image hosted by Photobucket.com

Mínimos olímpicos esses que se parecem resumir numa fórmula simples : 500 mg de funk + 500 mg de electrónica = electrofunk. Mas não é essa a lição que devemos tirar de tudo o que foi feito para trás. A fórmula é bem mais simples - 1000mg de funk. Se o funk é electrónico, não deixa de ser funk. Se o funk é orgânico e tocado em guitarras, não deixa de ser funk. Sempre foi esta a lição de Bambaataa, foi sempre isto que ele tentou demonstrar nas block parties que organizava com a Zulu Nation. Música é música, seja ela rock, pop, disco, o que seja. E há funk nisso tudo, tudo isso te pode por a dançar. Quando Bambaataa pedia a Jazzy Jay para tocar o break do Public Animal #9 do Alice Cooper, havia nele um secreto prazer em ver pessoas que ele conhece e que detestam rock n' roll ("eu não danço rock n' roll") a perder a cabeça na pista ao som de Alice Cooper. Mais ou menos como hoje acontece com aqueles que "não gostam de hiphop" mas não se cansam da Beyonce ou repetem o Drop it like it's hot do Snoop Dogg até à exaustão.

É interessante perceber que uma das premissas em que fenómenos válidos como os 2manydjs ou os nacionais Dezperados estão alicercados é uma aplicação directa deste conceito de Bambaataa. Conceito esse que é axiomático no hiphop e pelo qual todo o hiphop se rege, não só nos temas que produz (que samplam/buscam influências a tudo o que seja registo sonoro) mas também na atitude de comunidade e solidariedade entre todos os amantes de música que é apanágio do hiphop (e que devia ser apanágio da humanidade).

E quem não compreende tal relação positiva, em todos os sentidos, entre as pessoas e a música, não compreende o hiphop. Tão simples como isto.

(...continua amanhã)