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HitdaBreakz

3/29/2005

O FUTURO DO DIGGIN'




Na última Wax Poetics há um interessante texto sobre coleccionismo onde se avançam algumas noções históricas sobre esta actividade, concluindo-se que a colecção e o coleccionador são indissociáveis e que o sentido de uma colecção é muitas vezes impenetrável para o observador exterior. Quando, como acontece comigo, este espírito arquivista já leva mais de duas décadas de actividade, algumas perguntas começam a erguer-se no horizonte dos pensamentos:
Qual é o objectivo último deste espírito coleccionista?
Qual é o destino da minha colecção para lá do meu prazo de validade como ser vivo neste planeta?
Sejam quais forem as implicações filosóficas de tais perguntas (que surgem, normalmente, quando o pensamento testa os seus próprios limites) há algumas coisas que podemos dar como certas nesta vida - um holy grail é um holy grail e não importa quantos consigamos juntar ao longo da vida, nenhum deles fará connosco a travessia para o "outro lado". Tendo isso como certeza, há algum alívio para descobrir na ideia de que a colecção, se não dispersa após a morte do coleccionador, poderá reter algo do espírito da pessoa que a juntou. Todas as colecções acabam por representar o papel de biografia palpável das pessoas que as construiram.

E, claro, reflectir sobre o fim implica, quase sempre, tentar estender o olhar até ao futuro.
Valerá a pena continuar a coleccionar discos?
Que futuros nos reserva o futuro?
Fala-se neste momento no fim anunciado da produção de vinil, ligado à gestão dos recursos do planeta e à procura de alternativas às matérias primas conseguidas através do petróleo. É mais ou menos certo, portanto, que o vinil que continua a ser produzido terá os seus dias contados. Acredito que daqui a 10 ou 20 anos ainda se prense vinil, mas certamente com um mercado reduzido drasticamente, passando cada novo LP a valer uma pequena fortuna que, provavelmente, só a tribo audiófila, habituada a pagar os olhos da cara por cabos de Hi-Fi revistidos a ouro, poderá suportar. E o vinil - os títulos mais raros e queridos pelo menos - poderá até encontrar um local de eleição para ser apreciado nas casas leiloeiras mais famosas que ganharão milhões a organizar licitações a peças originais. Consigo imaginar um magnata japonês a preencher um cheque com muitos zeros para poder levar para casa, devidamente emuldurado, o primeiro maxi de DJ Shadow ou a edição original de Stunts, Blunts and Hip Hop de Diamond D. Pode soar a delírio, mas este cenário não deverá andar longe da verdade. E, provavelmente, os diggers do futuro serão funcionários de casas leiloeiras ou bancos que percorrerão o mundo a perseguir colecções com pedigree armados com cartão de crédito dourado e uma equipa de conservadores com formação museológica.

O futuro imediato do Diggin', no entanto, é um pouco mais brilhante. É de prever que discos que hoje são peças correntes pagos nas lojas a preços normais e acessíveis, por serem novas edições, possam ver o seu valor a crescer pois não irão sofrer o efeito desvalorizador de uma reedição facsímile daqui a 20 anos. O novo álbum da velha glória da Salsoul, Joe Bataan, por exemplo, não deverá estar a ser impresso em grandes quantidades, pelo menos no que ao formato vinílico diz respeito, e por isso esta será a última chance para o acrescentar ás nossas colecções. Por outro lado, é de esperar que algumas colecções angariadas nos últimos 20 ou 30 anos reentrem no mercado dentro de algum tempo, refrescando os stocks de lojas especializadas e dealers variados que hoje em dia quase nada têm para vender. Uma coisa é certa: foram impressos, ao longo das últimas 8 ou 9 décadas, muitos biliões de discos de milhões de títulos de centenas de milhar de artistas. E ainda há muita coisa por descobrir. Seja qual fôr o cenário, por aqui não se tenciona desistir tão cedo. Até porque se uma colecção conta a história de uma vida, ainda há muitos capítulos para organizar. E para já, no horizonte mais próximo, conto fazer com o Dub uma expedição que nos levará para lá da Ponte 25 de Abril até uma garagem recheada com um espólio de milhares e milhares de títulos. Haja tempo, paciência e alguns trocos e a nossa história poderá ainda continuar a desenrolar-se.

Ainda é só o princípio!