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HitdaBreakz

12/06/2004

MÚSICA PARA CINEMA # 4: MANFRED HUBLER & SIEGFRIED SCHWAB - VAMPYROS LESBOS




A mistura é deveras impressionante: o cineasta “louco” Jess Franco a dirigir uma produção hispano-germânica com a mítica Soledad Miranda, um enredo de mulheres vampiras com uma carga erótica acentuada e a incrível e hipnótica música do duo Manfred Hubler e Siegfried Schwab... É a receita definitiva do produto de culto. E Vampyros Lesbos é um dos filmes de maior culto da obra do prolífico Jess Franco. Este filme já foi reeditado em DVD (e mereceu uma exibição na circunspecta RTP1 – !!!! – há uns dois anos...) no âmbito de um interesse que se tem mantido vivo desde que o álbum Vampiros Lesbos foi editado pela Crippled Dick Hot Wax há uns anos.
Uma rápida investigação na internet começa por revelar a existência de um problema: entre o título do filme que usa a palavra “vampyros” com “y” e o título do disco que grafa a mesma palavra com “i”. Problema acentuado com a descoberta de uma edição semelhante na norte-americana Motel Records (com “Vampyros...” no título). Enfim, a impressão com que ficamos, depois de percebermos a total ausência de referências ao disco Vampiros Lesbos no site oficial da Crippled Dick Hot Wax, é de que esta não terá sido uma edição muito legal. O que só ajuda a fazer desta banda sonora um objecto de culto.
Interessará ainda saber – embora só complique um pouco mais as coisas - que a música incluída neste álbum não é exactamente uma banda sonora do filme Vampyros Lesbos, mas uma compilação de música de três filmes de Jess Franco – o já referido ópus de vampiras lésbicas, Mrs Hyde, She Kills In Ecstasy (e de facto é desse filme que sai o fotograma de Soledad Miranda que adorna a capa de Vapiros Lesbos) e The Devil Came from Akasawa. Estes são os três filmes que Soledad Miranda (espanhola de nacimento, mas filha de portugueses) fez antes de falecer num acidente de automóvel ainda na casa dos 20 e poucos.
E este é o elemento que faltava ao mito: uma morte trágica de uma jovem incrivelmente bonita, com um ar misterioso que fez a sua “fama” num filme em que desempenhava o papel da Condessa Carody, a vampira lésbica. A simples inversão do mito de drácula, acrescentando-lhe o travo “tabu” do lesbianismo conferiu ao filme razões para impacto à época. Mas a sobrevivência só foi garantida por algo mais. Pelo génio de Jess Franco, um realizador de séries Z que gostava de se comparar a um músico de jazz quando dirigia (e de facto um dos muitos pseudónimos com que assinou filmes de curtíssimo orçamento foi Clifford Brown...), a aura trágica de Soledad Miranda e a incrível música de Manfred Hubler e Siegfried Schwab.
Os actualmente reclusos Hubler e Schwab nada disseram em anos recentes sobre o combustível criativo deste filme, embora o subtítulo do álbum, Sexadelic Dance Party, revele que o LSD deve ter tido algo a ver com a atmosfera psicadélica e groovy da banda sonora. O facto de ambos terem vinte e poucos anos à data de estreia do filme em 1969 ajuda pelo menos a entender que eram compositores abertos à novidade. Daí o cruzamento desenfreado entre “fuzz guitars”, sítaras eléctricas, efeitos electrónicos e uma big band liberta de convenções: os grooves são pesados e em cima corre de tudo um pouco – jazz, soul, funk e aquele sabor exclusivamente europeu que atravessa as obras de gente como James Last ou Paul Mauriat. No final, e embora sabendo-se que no álbum Vampiros Lesbos (cuja edição “perdida” da Crippled Dick saiu em vinil logicamente vermelho sangue...) há música dos três filmes que Soledad fez antes de morrer, conclui-se que esta música traduz na perfeição o tabu e a aura profundamente sexual de Vampyros Lesbos. Aliás, o filme conta com uma realização nada ortodoxa de um Jess Franco a compensar a falta de dinheiro para efeitos especiais vistosos com um uso constante de zooms que conseguem o objectivo de nos perturbar. A música é perfeita a acrescentar um pouco de paranóia a esta atmosfera, carregando os grooves de sons que furam, como órgãos electrónicos ou sítaras, numa mistura hipnoticamente explosiva. Tudo isto com um som límpido e quase que se poderia dizer actual, na forma como subjuga a dinâmica de grupo a uma necessidade imperiosa de carregar o groove para a primeira linha dos acontecimentos.
Sexo, drogas e groovy music? Sem dúvida. Sleazy Listening da melhor colheita...

(PS: uma rápida busca na Net revelará edições em DVD deste mítico filme e também edições em CD na norte-americana Motel Records. Experimentem encomendar...)