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HitdaBreakz

12/15/2004

DIGS OF THE YEAR




Estamos no final do ano e é, naturalmente, tempo de balanços. Tenho a certeza de que para mim e para o Dub a inauguração deste blog no último Verão terá sido um dos pontos altos de 2004. Simplesmente porque era um sonho antigo dos dois - não o formato blog, mas um espaço para mostrar este tipo de conteúdos, que até desejávamos (e ainda, secretamente, desejamos) que fosse em papel. A reacção das pessoas, a fidelidade de alguns amigos que nos vão acompanhando através do sistema de comentários e, sobretudo, o estímulo que ambos recolhemos no que o outro escreve tem mantido este espaço vivo acima até das nossas expectativas iniciais. Penso que provámos que existe uma outra abordagem possível à música sem ter que passar necessariamente pela omnipresente novidade editorial e penso também que já ninguém duvida que olhar de forma sistemática para o passado ajuda a compreender o presente e o futuro. Claro que não fomos nós que inventámos a pólvora. Publicações como a Wax Poetics (o número 10 chega-me hoje às mãos), a Big Daddy, a Grand Slam (que aparentemente, como a sua antecessora Big Daddy, chegou ao fim), sites como o Soul Strut, o Vinyl Vultures e o The Breaks, gente como Egon, Dante Carfagna, Gilles Petterson, Soulman e toda a comunidade internacional que orbita em torno destas referências foram para nós uma inspiração decisiva. Tal como a explosão mais ou menos recente dos Audio Blogs e, em Portugal, de toda a gente que tem uma abordagem generosa da música, do pessoal do Fórum Sons e de amigos mais ou menos anónimos. Mas, sobretudo, não criámos nada de novo porque o que nos comanda, muito simplesmente, é um desejo profundo de conhecimento. O que nos comanda, repito, é toda a grande música - mesmo a pouco documentada - que foi sendo editada ao longo das décadas e deixando para trás essas pistas de plástico redondo, envoltas em magníficas capas de cartão que insistentemente nos puxam, nos obrigam a desviar rotas para as irmos encontrar em lojas mais ou menos refundidas, em feiras onde se vendem memórias, em casas insuspeitas onde repousam espólios pessoais de quem em tempos se dedicou com a mesma paixão a esse gesto inexplicável do coleccionismo. Penso que já é óbvio para toda a gente que essa memória impressa em vinil continua viva e pertinente. Nós aqui limitamo-nos a fazer eco disso.
Por isso, fica aqui uma amostra de um ano de diggin', com 10 discos seleccionados de entre os muito mais que fui trazendo para casa ao longo de 2004. Ouvir a música neles contida foi a melhor recompensa possível para toda esta actividade. Obrigado e desde já, para quem nos lê (e para todos os outros), tudo de bom.


Ensemble Al-Salaam - The Sojourner (Strata east, 1974)
Este upgrade de uma cópia em muito pior estado (que ainda assim rendeu 230 dólares no Ebay) veio da feira de Paço de Arcos. Antes do Verão ter secado as feiras. A banca do senhor que me vendeu esta cópia já rendeu outros discos fantásticos. No entanto este foi o único com selo da mítica Strata East. Jazz de elevação espiritual à procura de África. Muito bom!


Weldon irvine - In Harmony (Strata East, 1974)
Weldon Irvine era outro espírito livre, carregado de chama, carregado de groove. Este disco veio de uma troca com o meu grande amigo Zé Carlos que ao longo dos anos tantos e tão bons discos me tem arranjado. Preciosidade insuperável, com Weldon (agora justamente homenageado por Madlib através do alter ego Monk Hughes) a voar bem alto em temas carregados de alma.


The Soulful Strings - Another Exposure (Cadet, 1968)
Grandes covers de temas ainda maiores com um envolvimento lateral de Charles Stepney (é o arranjador de serviço em Since You've Been Gone), encomendado, ainda selado, dos Estados Unidos. Soul instrumental, com arranjos luxuosos e cadências irresistiveis.


James Brown - Hell (Polydor, 1974)
Duplo de James Brown encontrado na feira de Azeitão. É uma das melhores sensações do mundo: fazermo-nos à estrada, com a família, começar o dia diggin' in the crates e depois terminar a descobrir paisagens novas. Jimmy não precisa de apresentações e este álbum é duro, conturbado e estupidamente funky!


Dennis Coffey and The Detroit Guitar Band - Evolution (Sussex, s/data)
Sad Girl, Big City Funk e outros: grooves com um toque de psicadelismo pelo grande Dennis Coffey em mint condition e por meia dúzia de dólares? Yes please!


Fórmula 7 - Som Psicodélico (Parlophone, 1968)
Uma das maiores preciosidades da minha colecção, encontrada no mesmo crate dos Ensemble Al-Salaam: se o vendesse no Japão poderia dar entrada para um carro novo. E justifica-se: breaks, funk, samba, uma versão de Watermelon Man e outra de Pata Pata. Indiscritível!


Sérgio Mendes Trio - Bossa Nova York (Elenco, 1967)
Outro disco que me chegou às mãos através do grande Zé Carlos: Tom Dowd é o engenheiro de serviço (!!!!) e Sérgio Mendes tem ao seu lado gente como Tom Jobim, Hubert Laws, Art Farmer e Phil Woods. Um L-U-X-O!


Marcos e Paulo Sérgio Valle - O Fabuloso Fitipaldi (Philips, 1973)
Se este disco estivesse mint como o Fórmula 7 não renderia o dinheiro para dar de entrada para um automóvel, mas talvez para dar o sinal para um apartamento (estou a exagerar, claro, mas só um bocadinho): raridade absoluta que mostra os Azymuth na sua primeira incursão discográfica a executar músicas de Marcos Valle e do seu irmão Paulo Sérgio. Jazz-funk do melhor, com diálogos do filme/documentário sobre Fitipaldi pelo meio.


Janko Nilovic - Rhythmes Contemporaines (MP 2000, s/data)
Uma das melhores peças do excelente lote de Library Records arranjado este ano, onde se incluía igualmente a restante discografia de Janko Nilovic para a Montparnasse 2000. Holy Grail, claro, com o grande Nilovic a carregar de imaginação uma música que passa quase sempre pelo groove com arranjos luxuosos.


Keith Mansfield & Alan Hawkshaw - The Big Beat (KPM, 1969)
E finalmente, outro Holy Grail absoluto. Um dos mais procurados títulos da série 1000 da KPM, uma raridade absoluta, um monstro de um disco. Grooves, breaks, mais grooves e mais breaks, arranjados com o estilo inconfundível daqueles dois mestres. Repousa calmamente entre mais 100 álbuns grandes da KPM. 2004 foi um bom ano. Pelo menos nisto!

PS: Este post é dedicado ao meu grande amigo Dub! Bem hajas, rapaz!