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HitdaBreakz

11/09/2004

NOTAS SOLTAS E CASSETES VIRGENS




Para começar, um acerto de datas: a tal semana temática há-de arrancar, mas não - como aliás já devem ter percebido - esta semana. Temos algumas ambições para essa operação e isso exige um sincronismo de disponibilidades que, para já, está difícil de orquestrar comigo e com o Dub. Nada de dramático, só precisamos mesmo de mais algum tempo.
Entretanto chega hoje às bancas o Blitz nº 1045 que tem como particularidade trazer Eminem na capa e uma série de textos sobre Hip Hop a pretexto das celebrações de três décadas de um género. Dois desses textos são meus: um relata as origens do Hip Hop, procurando as raízes cósmicas desse big bang protagonizado por Kool Herc, e o outro tenta convencer quem o ler da absoluta pertinência e validade dos "novos" De la Soul de The Grind Date, um álbum tão espantoso pelo que contém quanto pelo que significa.
Entretanto, os sinais do impacto desta cultura - que já não é exclusivamente americana e se torna cada vez mais global a cada novo dia que passa - encontram-se em locais como o Centro de Juventude de Oeiras que no passado sábado serviu de palco ao 11º Festival de Hip Hop de Oeiras. Um evento nascido para apoiar o Graffiti, este festival expandiu-se e ao longo de um agitado dia expôs o talento de uma série de Writers em paineis de madeira, convocou curiosos para workshops com gira-discos e latas de tinta, disponibilizou bancas para compra de material e discos e, claro, facilitou o acesso ao palco de uma série de nomes importantes, de D-Mars aos Expensive Soul, de Tony MC Dread aos Mundo Complexo. Foi uma festa em cheio, plena de harmonia e diversidade que apenas leva a que se pense como será o nosso panorama musical daqui a 5 ou 6 anos se o potencial já revelado encontrar espaço para crescer? Poderá ser tremendo. E, nem de propósito, acredito que um dos primeiros sinais positivos para que isso possa acontecer é dado num texto de Sérgio Gomes da Costa na edição de hoje do Blitz: finalmente assume-se que já não existe um Hip Hop nacional, mas sim vários, estebelecendo-se entre nós esta cultura, em termos musicais pelo menos, como uma realidade multi-facetada. Ainda bem. Só da diversidade é que pode nascer a luz. A mim interessa-me um Hip Hop que não me olhe de lado por ouvir "fundamentalistas" como os De la Soul, os Gang Starr ou Masta Ace, monstros pop como Kanye West ou Snoop Dogg, profetas do underground como Gift of Gab, Prince Po ou Ed OG, "experimentalistas" como os da facção Anticon, visionários loucos como aqueles do campo Stones Throw, tipos que reunem um pouco de tudo isto como os Roots, DJs de todas as escolas como Cut Chemist, seguidores de um código arcano como os Jurassic 5 ou DJ Shadow, grandes profetas da palavra como Jay Z e Nas e tudo o resto que venha à rede e se revele bom peixe, por assim dizer... E isto, claro, sem falar nos grande monumentos do passado, como aqueles que foram ao longo dos anos sendo assinados por Pete Rock, Lord Finesse, Diamond D, Prince Paul, Premier, Dr. Dre et al... Só assim é que as coisas parecem fazer sentido - poder ouvir música sem primeiro identificar a barricada em que tem origem, o orçamento de marketing respectivo ou a label que a editou.
O mundo hoje em dia parece conter a promessa de uma página em branco ou de uma cassete vazia, como aquelas em que - há vinte anos - gravávamos a nossa própria personalidade ao cruzar, sem alaridos de espécie alguma, os Talking Heads e os Devo, os B-52's e os Material, os Clash e os Run DMC, o LL Cool J e os Blondie, o Herbie Hancock de Rockit e os Yellow Magic Orchetra, os Kraftwerk e os Pigbag. Se a palavra "saudosista" vos apareceu por cima da cabeça, num daqueles balões luminosos de banda desenhada, então não perceberam a ideia. O que eu quero dizer é que parece que vivemos tempos similares e as "cassetes" (exactamente iguais só que redondas em vez de rectangulares e digitais em vez de magnéticas) que hoje gravamos podem muito bem incluir tudo o que vai de Sean Paul aos Neptunes, de Petey Pablo ao reggaeton de NORE, dos Rapture a Timbaland, dos White Stripes a Jesus Walks de Kanye, de Mr Vegas a Snoop Dogg e dos De La Soul aos Franz Ferdinand, sem que, como diria a minha mãe, nos caiam os parentes na lama. Parece que se esbatem as fronteiras entre o que é mainstream e o que é underground e o sucesso de um artista é quase sempre proporcional ao investimento em marketing e não necessariamente uma questão de posicionamento estético. Ainda bem...
Enfim, ficam por aqui estas considerações soltas que outra coisa não pretendem do que levantar questões, sugerir possíveis discussões ou dar com a cabeça na parede. O sistema de comentários está aí à vossa disposição: digam de vossa justiça, sff!