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HitdaBreakz

10/12/2004

RED BULL MUSIC ACADEMY EM ROMA



O Dub já por aqui escreveu sobre a Red Bull Music Academy, mas nunca são demais os elogios a uma iniciativa destas. Ao seleccionar criadores de música dos diversos países onde está implantada, a Red Bull está a assumir - muito mais do que uma passiva posição de mecenas - um papel bem activo de alguém que quer intervir directamente na área da criação musical, ao colocar à disposição de umas largas dezenas de felizes contemplados uma cuidada selecção de estímulos que podem ter uma influência decisiva nos rumos da sua produção.

DJ's e produtores são, essencialmente, a matéria prima que a Red Bull quer ajudar a moldar e para isso convoca nomes bem estabelecidos de correntes estéticas diversas, mostrando claramente estar em cima do acontecimento (os géneros mais recentes e fervilhantes, como o tão falado Grime, estiveram já este ano representados). E depois, claro, há algo de mágico em passar ao final do dia, após as conferências, nos diversos estúdios montados nos três andares de um squat remodelado e ver um DJ de hip hop croata a explicar técnicas de scratch a um DJ sueco ou observar como um produtor americano e outro sul-africano trocam truques de programação de um nordlead em alegre e distraído convívio. Finalmente há as noites que se podem revelar autênticas surpresas, como a que nos levou a um clube construído na cave de um velho edifício e que se assemelhava a uma catacumba ou abrigo anti-aéreo onde um jovem neo-zelandês nos deu uma lição de dancehall, recorrendo aos mais recentes bootlegs, cruzando discos com pertinência, bom gosto e sentido de humor. Duas horas de pura energia onde se queimaram algumas calorias sem dúvida (não muitas, que as pastas, as pizzas e os gelados são fantásticos, já para não falar que uma garrafa de cerveja tem o tamanho standard de 0,66 cl!!!!).
Com um tratamento de luxo por parte da organização (hotel-daqueles-que-parecem-do-cinema, restaurantes seleccionados...), assistir às palestras foi o culminar da perfeição.
Plasticman conduziu-nos através do ultra-rápido mundo do Grime e milhões de sub-géneros que começam a despontar (dubstep, anyone?) à velocidade da invenção. Este jovem produtor que já foi recrutado por Richard D James para a Rephlex, ilustrou o paradoxo de uma música de clubes que está a ser criada por gente demasiado jovem para frequentar clubes, com sons cada vez mais pesados onde a combinação correcta dos beats mais duros com as frequências mais baixas do mundo assegura sucesso nas pistas!

Sa-Ra Creative Partners com Jefferson Mao

Claudio "Goblin" Simonetti
As minhas conferências favoritas, no entanto, pertenceram aos Sa-Ra Creative Partners e ao senhor Claudio Simonetti.
Os Sa-Ra são um trio de criadores que nesta conferência foi representado por Om'Mas e Taz, dois dos vértices daquele que poderá ser o próximo furacão criativo depois dos Neptunes. O jornalista norte-americano Jefferson Mao mediou a conversa. Com produções para gente como Pharoahe Monch (o ex-Organized Konfusion que é a mais recente contratação da Shady de Eminem...) ou Jurassic 5 (chequem o tema Hey do grande Power in Numbers...), os Sa-Ra falaram da influência do jazz, da abertura das suas cabeças, da atitude experimental que norteia as suas passagens por estúdio, do grande espírito livre Sun Ra que lhes inspirou o nome, mas falaram igualmente em determinação, espírito de negócio, objectivos concretos. Pelo meio mostraram música excelente, onde a soul, o jazz e a electrónica são apenas coordenadas de pequenas viagens inter-espaciais que nos levam até território absolutamente novo. Os Sa-Ra Creative Partners têm um álbum para sair muito em breve na Ubiquity. Preparem-se, pois vai ser uma pequena revolução.
Claudio Simonetti é puro old-school. Todos os outros oradores apoiaram as suas palestras com amostras áudio retiradas de laptops-último modelo cheios de estilo, mas este senhor chegou à sala com uma série de vinis debaixo do braço. Falou dos Goblin e de como foi quase por acidente que este seu grupo começou a produzir bandas sonoras para os filmes de terror de Dario Argento. Este homem, nascido em São Paulo, no Brasil, provém de uma família musical (ele revela em tom bem humorado um episódio em que os Goblin só foram destronados do primeiro lugar do top italiano por um disco do seu pai... em que os músicos dos Goblin também tocavam...) e possuiu sempre um espírito de aventura, no que à música dizia respeito. Apesar de ter criado algumas bandas sonoras bem sombrias (Profondo Rosso, Tenebre ou Zombi são algumas das mais emblemáticas), Simonetti tem um espírito bem disposto. Aliás, o carácter sombrio dos seus discos com os Goblin foi sempre mais uma questão de experimentação e contexto do que uma real consequência de um espírito torturado. Os discos dos Goblin, no entanto, venderam milhões de cópias em todo o mundo, facto atestado pela existência de prensagens portuguesas de "Profondo Rosso", por exemplo, o que em 75 não aconteceria se o disco não fosse um fenómeno. Apesar do sucesso e da consequente abundância de cópias, os discos dos Goblin são hoje raros e já se fazem pagar na casa das dezenas de dólares ou euros.
Simonetti não fez apenas discos de jazz-prog e dedicou-se ao disco sound quando os Goblin se desfizeram, conseguindo tornar-se um dos pioneiros do italodisco. O seu I Need Love como Capricorn é hoje um clássico e Simonetti até revelou que há um disco inteiro dos Capricorn por editar! Apesar do seu inglês algo destreinado, Claudio Simonetti revelou ser um comunicador nato, transmitindo-nos com clareza a magia dos tempos da tecnologia analógica, quando ainda não havia "nem computadores, nem plug-ins", como fez questão de explicar. Fantástico.

Além das palestras e das passagens pelos estúdios, a Red Bull Music Academy de Roma ainda ofereceu noites entusiasmantes, com DJ's escolhidos entre os formandos e nomes mais conhecidos como os Front 242 ou Zed Bias a tomarem conta das operações. Claro que no meio de um cenário perfeito como este só faltavam mesmo os discos...
Aproveitando as sugestões (e moradas...) da documentação fornecida pela Red Bull, conseguimos visitar várias lojas, como a Goodfellas, a Rinascita, a Remix, a One Love e a Transmission. Nenhuma delas, no entanto, oferecia o que interessava: as selecções de soul e funk eram pobres e previsiveis, a música italiana relevante não existente, os libraries italianos que tão famosos são nem apareciam, o jazz estava completamente ausente. Enfim, apetece dizer que Roma está seca no que aos discos diz respeito e para uma cidade com tanta arqueologia, os tesouros vinílicos não existem. Mas sei que é perigoso generalizar e que ficaram muitas lojas por descobrir, apesar dos quilómetros e quilómetros calcorreados em busca de algum spot fora das rotas turísticas. Enfim, o capítulo vinílico de Roma ainda precisa de ser mais explorado.
Os atractivos de Roma - no que à paisagem feminina diz respeito - não são tão lendários como isso. O exemplar mais interessante que encontrámos afinal era da Nigéria, chamava-se Linda (pois claro...!) e servia à mesa. Uma vez mais, como nos discos, admito que talvez não tenhamos visto tudo. Talvez os Lamborghinis na rua, o trânsito caótico (Lisboa é o paraíso em termos de trânsito, se comparada com Roma...) e a intensa poluição nos tenham distraído. Será preciso voltar para confirmar uma série de coisas.
Fica para uma próxima vez.
Parabéns à Red Bull!