1/21/2008
Vinil na idade digital
Hoje, no Público, Victor Belanciano escreve sobre o facto de os novos suportes digitais estarem a comprometer a qualidade do som que se ouve. A Rolling Stone, no dia a seguir ao natal - talvez por saber que tantos iPods iriam aterrar nos sapatinhos de todo o planeta - publicou um artigo a que deu um título com uma óbvia carga dramática: em "A Morte da Alta-Fidelidade" Robert Levine explicava como a compressão dos MP3, por um lado, e a chamada Loudness War, por outro, têm vindo a provocar um decréscimo na qualidade do som da música que ouvimos. Essas são parte das razões para que algumas edições em CD de finais dos anos 80 e inícios dos anos 90 comecem a atingir preços significativos no mercado do coleccionismo - nessa época, ainda não se pensava em termos de "masterização digital" e os primeiros CDs pouco mais eram do que transcrições digitais dos masters analógicos. E de alguma maneira, essas edições retiveram as principais qualidades dos respectivos masters. Hoje pensa-se de forma diferente e para que o impacto seja maior - na rádio, no iPod ou na aparelhagem lá de casa - a vertigem do volume tem comandado as preocupações dos engenheiros de som na hora de masterizar. Mas agora, uma outra obrigatoriedade condiciona esses mesmos engenheiros quando masterizam um novo disco: pensar nos pequenos monitores dos computadores e nos minúsculos auscultadores em que toda a gente parece hoje ouvir música. Concessão, atrás de concessão, atrás de concessão. O som tem sofrido as consequências e a música, claro, tem sido penalizada por isso.
E por cá? Bem, por cá recuperam-se clássicos da década de 80 "Do Tempo do Vinil", reeditam-se algumas obras perdidas nesse formato e alimentam-se estratégias de mercado com a coolness do sete polegadas - a revista Blitz ofereceu um single de vinil de Tiago Bettencourt aos seus leitores. E estes são apenas alguns exemplos de resistência do vinil na era da transformação digital. Quem sabe se um dia destes o vinil ainda revela ser o balão de oxigénio desta moribunda indústria: quando o CD surgiu, facturaram-se quantias incalculáveis a vender pela segunda vez os mesmos discos às mesmas pessoas. Houve quem tenha convertido colecções inteiras para o novo formato e a indústria esfregou as mãos de contente pois estava a vender masters que há muito estavam pagos. Será que vamos assistir a uma nova febre de reedições, mas desta vez para colocar em vinil tudo o que apenas foi editado originalmente em CD? É que tudo indica que os CDs estão para sair de cena e só os formatos que se apoiam na internet para distribuição - MP3, etc. - e o vinil têm sobrevivência garantida. Os próximos episódios ditarão os caminhos a seguir...
Entretanto, alheios a tudo isto parecem estar os senhores e senhoras que todos os domingos lá vão transportando caixas e caixas de plástico com promessas de revelarem algumas preciosidades no meio dos detritos que as décadas também foram imprimindo em vinil. O lado menos positivo da questão é que há quem ache que tudo o que os Beatles, Amália ou Dire Straits fizeram vale o seu peso em outro. Felizmente, a "fome" orienta-nos as compras para outras direcções... E ainda bem, porque não há MP3 que faça justiça ao "Rock Steady" de Aretha ou às delicadas curvas da melodia que Marcos Valle e Elis Regina traçam em "Terra de Ninguém".